Na quinta-feira 20, durante protesto que reuniu mais de 30 mil pessoas em Brasília, um militar usando um gorro na cabeça, bermuda e com um capacete da PM nas mãos entra no Itamaraty, enquanto manifestantes tentam quebrar a pontapés as vidraças da sede do Ministério das Relações Exteriores. Cercado por policiais militares, ele avisa que é fuzileiro naval antes mesmo de pular as janelas quebradas pelos manifestantes. Ele chega a deitar no chão e é imobilizado pela PM, que pisa em seu braço. Depois é simplesmente liberado. Na semana passada, a Marinha abriu uma sindicância para esclarecer as circunstâncias da presença do militar na manifestação. Há fortes suspeitas de que ele estivesse infiltrado nos movimentos. O regulamento disciplinar militar proíbe expressamente qualquer tipo de participação em manifestações e exige apartidarismo político.

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INTRUSO
Na quinta-feira 20, enquanto manifestantes quebram janelas do Itamaraty,
um fuzileiro entra no prédio (foto 1), é cercado por militares (foto 2)
e liberado depois de se identificar (foto 3). A Marinha apura o caso

Assim como em Brasília, nas principais capitais do País gangues neonazistas, organizações criminosas, traficantes e bandidos comuns têm se misturado aos protestos legítimos para saquear, roubar, depredar o patrimônio público e provocar confrontos com a Polícia. Integrantes desses grupos já foram identificados por setores de inteligência das polícias estaduais e presos, como o ex-presidiário Rafael Braga Vieira e Edvan Ezequiel Bezerril, traficante da favela Nova Holanda, no Rio de Janeiro.

Conforme apurou ISTOÉ, a estratégia de ação dos infiltrados é traçada bem antes de começar a manifestação. Em Porto Alegre, bandidos da região metropolitana chegam um dia antes na capital, dormem em hotéis com diárias em torno de R$ 10 e saem em bondes, como são chamados, para aproveitar as marchas e cometer crimes. O delegado Hilton Muller, titular da 17ª Delegacia da Polícia Civil, disse que a polícia vem estudando a rotina dos marginais e tenta mapear as formações. Em todo o País, polícias estaduais formaram forças-tarefas para investigar exclusivamente a ação de traficantes, anarquistas radicais, organizações extremistas e também ladrões comuns nos protestos. “O setor de Inteligência da Polícia está filmando as manifestações para identificar essas pessoas. Recebemos informações sobre a ação de traficantes, mas apenas com os apelidos deles, o que dificulta a prisão”, contou o delegado carioca Mário Andrade, que é da Delegacia do Consumidor, mas foi destacado para a missão especial. “Eles se infiltram e se valem do anonimato no imenso contingente de pessoas para cometer crimes”, confirma o delegado gaúcho Marco Antonio Duarte de Souza, do departamento de polícia metropolitana do Rio Grande do Sul. Na quinta-feira 27, numa reunião com o governador Tarso Genro, os próprios líderes das manifestações pediram investigações sobre a possível ação de grupos neonazistas durante os protestos.

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APREENSÃO
A Polícia do Rio encontrou na casa de Arthur Nunes
faixas com suásticas, armas brancas e soco inglês.
O livro apreendido, porém, tratava apenas sobre música punk

No Rio, cerca de 20% das informações referentes às manifestações que chegam ao Disque-Denúncia, canal direto com a população, alertam sobre a infiltração de traficantes nos protestos, segundo disse à ISTOÉ o coordenador carioca Zeca Borges. “Quando eles começam a se organizar para descer para as manifestações, as pessoas de bem das comunidades ligam e avisam”, explicou Borges, que repassa imediatamente as denúncias para os setores de inteligência da Secretaria de Segurança Pública. De acordo com os delegados que apuram a presença de infiltrados nos protestos, já foi possível identificar traços comuns entre os bandidos, independentemente da cidade. O traje quase sempre é bermuda ou calça jeans, tênis e mochila. A maioria cobre o rosto com blusas ou máscaras. A principal estratégia dos infiltrados é se misturar à multidão e definir, ali mesmo, qual é o melhor lugar e hora para começar a arruaça. Também optam por se dispersarem para depredar e roubar o que for possível. A mochila é usada, muitas vezes, para carregar artefatos como bombas de fabricação caseira.

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O saldo mais negativo foi registrado no Rio de Janeiro. Uma manifestação pacífica na avenida Brasil, na altura de Bonsucesso, acabou virando guerra na favela Nova Holanda, que fica nas imediações, na terça-feira 25. Tudo começou quando traficantes desceram da favela para realizar um arrastão na passeata e a PM reagiu. Eles fugiram para dentro da comunidade e a troca de tiros foi intensa. O triste resultado incluiu a morte de dois moradores inocentes, um sargento do Batalhão de Operações Especiais (Bope) da Polícia Militar, e sete pessoas que, segundo a PM, eram ligadas ao tráfico. Durante uma das manifestações no Rio, a polícia monitorou Arthur dos Anjos Nunes e encontrou em sua residência faixas com suásticas, armas brancas e soco inglês. Nunes, no entanto, conseguiu escapar do cerco policial e encontra-se foragido. Considerado neonazista, ele já respondia a processo por agressão a guardas municipais.

Colaborou Eliane Lobato
Fotos: Reprodução TV Folha; Diego Reis


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