Há duas semanas, o empresário italiano Stefano Da Fies, de 62 anos, dono de uma pequena construtora, trancou a sala do escritório, abriu a gaveta da escrivaninha, pegou o revólver e deu um tiro na cabeça. Em carta, explicou a razão que o levou a tirar a própria vida: o abismo financeiro em que mergulhara nos últimos dois anos. A tragédia de Da Fies não é um caso isolado. Recentemente, Fermo Santarossa, de 73 anos, famoso empreendedor do setor imobiliário, negou-se a levar adiante um plano de reestruturação que resultaria na demissão de 80 de seus 500 funcionários. Santarossa foi encontrado morto no lago perto de sua casa, na cidade de Pordenone, e as autoridades chegaram à conclusão de que ele se matara. Sufocada por uma severa crise, a Itália vive uma onda de suicídios sem precedente. Segundo levantamento feito pela Link University, uma das universidades de maior prestígio do país, em 2013 os suicídios motivados por questões econômicas cresceram 40% em relação a 2012. A cada dois dias, um italiano tira a própria vida para fugir da ruína financeira. “Os dados são muito claros”, diz Nicola Ferrigni, professor de sociologia da Link. “É uma situação dramática que permanece invisível aos olhos dos governantes.”

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PROTESTO
Boneco enforcado diante do prédio da Equitalia, agência do
governo responsável pela cobrança de impostos em atraso

A onda silenciosa de suicídios começou em 2012, com o empresário Giuseppe Campaniello, que, endividado, ateou fogo ao próprio corpo em frente à Equitalia, a agência de cobrança fiscal do governo. O gesto radical de Campaniello acabou estimulando outros suicidas e a situação agora parece estar fora de controle. Para sensibilizar a opinião pública, a também empresária Simona Pedrazzini, coordenadora nacional da Confederação dos Contribuintes, criou uma página no Facebook em que relata os problemas dos empresários. “Nós vivemos com medo de ver o sacrifício de uma vida ser literalmente arrancado de nossas mãos”, diz Simona. “Não vejo nenhum compromisso do governo para dar um basta nessa situação.” Ela conta que, até pouco tempo atrás, empregava 16 pessoas. Hoje, mantém apenas dois funcionários e tudo indica que, em breve, terá de se livrar deles também. “Nós, empresários, não temos mais crédito bancário para comprar matéria-prima. Éramos o pulmão desse país e agora somos obrigados a demitir.”

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Desde o ano passado, várias associações e entidades de classe estão se mobilizando para cobrar ações eficazes do governo. A Confederação Nacional dos Artesãos (CNA) lançou uma campanha nacional com um mote provocativo: “Não queremos morrer: que os bancos nos deem oxigênio e o Estado pague suas dívidas”, dizia o texto. No início de junho, um grupo de empresários ficou só de cueca diante do prédio da Equitalia para exigir o fechamento da agência responsável pela cobrança de multas e impostos em atraso. Segundo os manifestantes, a insensibilidade da Equitalia seria uma das responsáveis pelo elevado número de suicídios. Certamente é exagero imputar a tragédia a uma agência fiscal, mas os números da crise econômica impressionam. Nos três primeiros meses de 2013, o PIB da Itália encolheu 0,6% ante o trimestre anterior e já há mais de quatro milhões de italianos vivendo em estado de pobreza. Dados da União Italiana das Câmaras de Comércio e Indústria revelam que, em 2012, mil empresas faliram por dia e, em 2013, o ritmo da quebradeira continua intenso. Pior ainda: a dívida pública da Itália equivale a 131,7% do PIB, o que impede o governo de fazer os investimentos necessários para o país andar. A Itália parece mesmo estar com a corda no pescoço.

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Foto: DAVIDE BOLZONI/ansa