Até julho de 1996, o legista Fortunato Badan Palhares, da Unicamp, costumava dizer que jamais tivera um trabalho contestado. Na comunidade científica, todos já sabiam que não passava de blablablá. Para os brasileiros em geral, porém, Badan era portador de um prestígio considerável. Depois que o legista anunciou que PC Farias fora morto por sua namorada, Suzana Marcolino, que se suicidara em seguida, tudo mudou. Nesses quase três anos, Badan não conseguiu explicar nem ao Ministério Público de Alagoas nem à sociedade como é que chegou a tal conclusão. Na quarta-feira 5, em sua casa, Badan prestou um depoimento de quase seis horas ao promotor Luiz Vasconcelos e aos delegados Antônio Carlos Lessa e Alcides Andrade. "Ele não provou, mas garantiu que mediu pessoalmente o corpo de Suzana. Para nós, essa responsabilidade é fundamental", disse o promotor. O que o Ministério Público tenta descobrir é se as falhas contidas no laudo são intencionais ou não. O promotor e os delegados já sabem que foi montada uma farsa. Agora, buscam os responsáveis pela armação.

O ponto mais vulnerável do laudo de Badan é a altura de Suzana. O legista da Unicamp assegura que a namorada de PC tinha 1,67m. Fotografias e depoimentos dos familiares de Suzana, no entanto, mostram que ela tinha menos de 1,63m. Cientificamente, o legista Daniel Muñoz, da USP, que exumou o corpo de Suzana, mostra que a moça media cerca de 1,57m. Todo o trabalho de Badan foi filmado. São oito fitas, mas nenhuma delas registra a medição de Suzana. "Badan elaborou o laudo a partir de uma tese preconcebida", afirmava o também legista Nelson Massini, antigo professor de Badan, em agosto de 1996. No mesmo ano, Badan disse em um debate na rádio CBN que se a altura de Suzana não fosse 1,67m todo o seu trabalho estaria prejudicado. No ano seguinte, ele reafirmou essa convicção em um artigo escrito para a Folha de S. Paulo. Na semana passada, Badan disse aos delegados que a altura de Suzana não era tão importante.

Quando soube que Muñoz usou uma tabela de projeção dos ossos longos usada em todo o mundo para determinar a altura de um cadáver, Badan tratou de desacreditar o colega. Afirmou que o critério não era confiável. Na terça-feira 4, os delegados tomaram conhecimento de seis trabalhos de Badan elaborados a partir da mesma tabela usada por Muñoz. "Esse caso não se resume a uma guerra de peritos. Há muito a ser feito, mas até o final de maio esse caso terá um desfecho e com certeza algumas pessoas estarão no banco dos réus", diz o juiz Alberto Jorge Correia Lima.