Calada desde o estouro do escândalo dos bancos, a Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F), sediada em São Paulo, começou a revelar para uma pequena confraria o outro lado das operações de socorro ao Banco Marka. Em reuniões matinais fechadas com as corretoras e distribuidoras de valores, realizadas na semana passada, os diretores da BM&F – também donos de corretoras – confirmaram a seus pares as relações impróprias entre o BC e o banqueiro Salvatore Cacciola. Contaram que o presente de pai para filho dado ao banco foi bem maior do que o necessário. Além da mesada, o "pai" BC ofertou ao "filho" Cacciola um prêmio por mau comportamento, uma bolada que teria reduzido o prejuízo do Marka de US$ 60 milhões para cerca de US$ 10 milhões. A Comissão de Sindicância do BC concluiu que não houve participação de funcionários da instituição em nenhum esquema. O resultado agradou a seu presidente, Armínio Fraga. "Não há qualquer indício de vazamento", garantiu ele, na quinta-feira 29.

Corretores presentes às reuniões da BM&F contaram a ISTOÉ que a direção da Bolsa se disse surpresa com a generosidade do Banco Central presidido por Chico Lopes. Em 13 de janeiro, o Marka tinha 11.300 contratos nos quais se comprometia a vender dólares, no futuro, a uma cotação de R$ 1,22. Cada contrato equivale a US$ 100 mil. Pressionado por Cacciola, o BC vendeu 12.650 contratos ao banco, muito mais dólares do que necessário para fechar as contas. O prêmio extra do Marka foi, portanto, de 1.350 contratos (ou US$ 130 milhões), concedido sob o argumento de que havia "outras obrigações" a saldar em outros mercados fora da BM&F, segundo informações do Banco Central. Toda a operação foi feita a um valor camarada de R$ 1,27, quando a cotação da moeda americana já pressionava o limite de R$ 1,32. Como se não bastasse, grande parte desses contratos, incluídos na de operação salvamento, teria sido vendida nos dias seguintes pelo próprio Marka por uma cotação bem superior, entre R$ 1,75 e R$ 1,80 por dólar. Vale ressaltar que o banco, após firmar acordo com o BC, deveria estar fora do mercado, condição aceita por Cacciola para receber o socorro. "Informalmente, o BC disse à BM&F que esses contratos teriam sido usados para liquidar obrigações na Bolsa de Chicago", disse um banqueiro que conhece intimamente o caso Marka. "Naquele momento estranhamos tanta bondade com o Marka", confirma um diretor da BM&F. Ao comprar do BC dólares a preço de chuchu enquanto os brasileiros perdiam o sono com a disparada da moeda americana, Cacciola conseguiu quitar nove mil contratos do próprio Marka e 2,3 mil contratos dos fundos de investimento Stock Máxima. Um desses fundos tinha o próprio banqueiro como único cotista.

O presente do BC incluiu, segundo a Bolsa, a não-execução das garantias dadas pelo Marka nos contratos de venda de dólares. Diretores da BM&F asseguram que elas eram suficientes para cobrir o prejuízo da aposta errada do banqueiro, sem abalar os pilares da Bolsa, muito menos os da Nação. No pior dos cenários, a BM&F perderia apenas R$ 70 milhões de seu caixa, pouco para uma operação que totalizava R$ 1 bilhão. ISTOÉ ouviu de três operadores que a correspondência enviada pela BM&F ao BC, alertando para o risco de uma "crise sistêmica" havia sido elaborada depois que a ajuda ao Marka já estava acertada. Foi datada do dia 14 de janeiro para justificar toda a operação. Quem assinava a carta era o superintendente da BM&F, Dorival Rodrigues Alves, que veio a falecer dias depois numa trágica coincidência. "Foi seu último ato", diz um dos operadores.