Oito em cada dez seres humanos vivem nas cidades. Se a proporção assusta, mais espantoso ainda é constatar que, no próximo século, todos os caminhos levarão a um planeta ainda mais urbano. As últimas cinco décadas foram marcadas, em quase todos os pontos do mundo, pela fuga do campo para os grandes centros e a criação das megacidades, formigueiros humanos como Tóquio, Cidade do México, São Paulo, Bombaim e Nova York. Apenas algumas regiões da Ásia e da África ainda preservam a maioria da população em áreas rurais. Os especialistas garantem que a urbanização continua, mas os alvos, no futuro, serão as cidades médias. “Na última década, foram os núcleos médios os que mais cresceram. Tudo indica que esta tendência será mantida nos próximos anos”, afirma a arquiteta Raquel Rolnik, professora da Pontifícia Universidade Católica de Campinas (Puccamp) e pesquisadora de temas relacionados ao crescimento demográfico no Instituto Polis.

A criação de uma extensa rede, com cidades de todos os tamanhos, também é esperada. “Ao contrário do que se pensa, as megacidades não vão se disseminar no planeta”, prevê Raquel. Assim, as megacidades não irão conti-nuar inchando com a rapidez imaginada pelos mais pessimistas. E a boa notícia, atestam os pesquisadores, é que São Paulo, o maior centro urbano da América Latina, já não cresce no ritmo alucinado das últimas décadas e começará sua fase de reestruturação no século XXI. Na avaliação de Rosana Baeninger, professora da Unicamp e autora da tese de doutorado Migrações internas no Brasil: metropolitanos e não metropolitanos, São Paulo não se configurou como megalópolis como apontavam vários estudos para a virada do milênio, como as perspectivas de urbanização mundial do Fundo das Nações Unidas para a População, Fnuap, realizados em 1990. De acordo com o levantamento, no ano 2000 a cidade de São Paulo seria a segunda maior do mundo, com 22,1 milhões de pessoas, atrás apenas da Cidade do México. Hoje, São Paulo tem dez milhões de habitantes. “O que pesou para que não tivéssemos uma explosão populacional foi a diminuição da imigração, o retorno dos migrantes para suas cidades e, a partir dos anos 60, a queda dos índices de natalidade”, explica Rosana. Nos anos 70, o município de São Paulo crescia a uma taxa média de 6,7% ao ano. De 1991 a 1996, caiu para 0,4%. A previsão de que haveria, no final do século, uma explosão urbana centralizada também não se confirmou porque o êxodo acentuado do campo para a cidade foi se dissipando a partir dos anos 80, quando começou a haver uma migração de cidade para cidade.

Está provado, neste final de século, que a qualidade de vida está longe dos grandes centros. Uma saída apontada pelos principais núcleos de estudo do tema é conectar pequenos municípios a grandes centros, como no modelo holandês. E, como assinala o professor Júlio Katinski, da Faculdade de Urbanismo da Universidade de São Paulo, (USP), não é o tamanho ou o número de habitantes que caracterizam a qualidade de vida como péssima ou ótima. É preciso lembrar que, na virada do milênio, em muitas cidades ainda não se conseguiu sanar problemas básicos de infra-estrutura e saneamento ambiental que englobam água, lixo, esgoto e drenagem. No Brasil, na África e na Ásia, grande parte da população sofre com a falta de esgoto. Atualmente, 80% da população brasileira tem água encanada, mas o lixo urbano ainda é um problema. Muitos municípios nem sequer contam com aterros sanitários. “Nos próximos anos, precisaremos concentrar esforços para combater a falta de esgotos e o problema do lixo”, afirma a pesquisadora Raquel. A vida de alguns milhões de pessoas depende destas soluções.


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