Uma fazenda na divisa do Maranhão com o Pará envolve ainda mais o irmão de PC, deputado Augusto Farias (PPB-AL) com a quadrilha de Hildebrando Pascoal, que perdeu o mandato sob acusação de chefiar o tráfico de drogas, fazer contrabando, atravessar carga roubada e liderar o esquadrão de extermínio no Acre. A quadrilha foi denunciada na CPI do Narcotráfico, na semana passada, pelo ex-segurança e caminhoneiro Jorge Meres Alves de Almeida. A comissão chegou perto dos interesses que unem Augusto Farias ao Estado do Maranhão. Em depoimento à CPI no dia 30 de setembro, Meres, que está preso, botou no mesmo balaio Augusto Farias, o ex-deputado Hildebrando Pascoal, o deputado estadual do Maranhão José Gerardo (PPB) e o advogado William Sosa (ou William Marques, como dizia se chamar). Os quatro seriam os cabeças de uma rede criminosa dedicada ao tráfico de drogas, armas, roubo de cargas nas estradas e assassinatos por encomenda com ramificação em 14 Estados brasileiros e até na Bolívia.

Na quarta-feira 6, a CPI ouviu Augusto Farias e José Gerardo e saiu depois de dez horas de depoimentos com um mapa pouco conhecido de uma parte da divisa entre o Maranhão e o Pará. Dentro da região apontada como epicentro do roubo de cargas nos dois Estados, que fica entre Santa Inês (MA) e Belém, próximo à BR-316, existem duas propriedades: uma da família Farias e outra do deputado José Gerardo. A fazenda dos Farias, um conjunto de quatro propriedades que soma 1,9 mil hectares, fica em Nova Olinda (MA) e está no nome de Maria Rume Bianor Farias, cunhada de Augusto, com procuração para o marido, José Rogério Cavalcante Farias, irmão do deputado. Na região, no entanto, basta perguntar quem é o dono da propriedade e a resposta é quase sempre a mesma: Augusto Farias. A família Farias tentou vender recentemente a propriedade e um dos procurados foi o prefeito de Bacabal (MA), José Vieira Lins (PTB), acionado por um corretor conhecido como Paraíba. “Me disseram que era do irmão-deputado do PC. Só não comprei porque a terra ali é ruim. Só dá capim”, disse o prefeito. “É uma coincidência desgraçada a terra dos Farias ficar em uma das bases da quadrilha, onde acontece o roubo de cargas. Com tanto lugar do mundo para ter uma fazenda, escolheram logo ali”, disse o deputado Moroni Torgan (PFL-CE), relator da CPI. A área, próxima ao município de Santa Inês, é base eleitoral do deputado estadual José Gerardo.

Augusto Farias, acolhendo os conselhos do irmão Rogério – que sentava à última fila do plenário – para ser mais firme, perdeu o controle. Gesticulando muito e chegando a bater com a mão na mesa, contou que na fazenda, comprada há três anos, é criado gado de corte. Um outro momento de desespero foi registrado, quando, aos berros, disse não aceitar participar de uma acareação com o motorista Jorge Meres. “Acareação é coisa de bandido com bandido. Não admito isso!” Depois de sobrevoar a área, a Polícia Federal descobriu que a fazenda tem apenas oito cabeças de gado. Mas tem uma pista de pouso. A PF busca agora provas e testemunhos de que Augusto Farias, que diz nunca ter pisado na propriedade “e no Maranhão”, não apenas esteve na fazenda como é seu real proprietário. Um dos membros da quadrilha, o terceiro sargento da PM maranhense, Antônio Lisboa Corrêa, afirmou na Delegacia de Homicídios de São Luís que frequentava a fazenda “de propriedade de Augusto Farias”. O caseiro da propriedade, de nome Epitácio, que o irmão de PC diz ter demitido há quatro meses, está sendo procurado pela polícia. A fazenda encontra-se fechada. Segundo fontes da polícia, o caseiro revelou ter visto Augusto na propriedade. O deputado alagoano admitiu que seu irmão visitava a fazenda a cada quatro meses e que a família não podia se responsabilizar pelas pessoas que o caseiro recebia quando estava fora da propriedade. “A culpa é sempre do mordomo”, ironizou um policial federal que esteve no Maranhão. José Rogério Farias será chamado a depor na CPI. “Boto a minha mão no fogo por toda a minha família”, disse Augusto.

A cerca de 150 quilômetros de distância da propriedade dos Farias fica a fazenda do deputado estadual José Gerardo. Ela também coleciona fatos curiosos. Tem uma pista de pouso clandestina, sem registro no Departamento de Aviação Civil (DAC), sendo que ali costuma pousar um avião, o Seneca III prefixo PT-VKV. O avião, assume José Gerardo, é seu. Mas o deputado não tem registro da aeronave que diz ter comprado há dois anos. Também nunca declarou o avião como seu patrimônio no Imposto de Renda. Os outros dois chefes da quadrilha denunciada por Jorge Meres também estão na mira da CPI. Preso na PF em Brasília, Hildebrando Pascoal nega a acusação. O advogado William, que está em Campinas, foi intimado a depor na quarta-feira 13. “Se não vier, vai ser preso”, avisa Moroni Torgan. “Tudo o que o caminhoneiro denunciou está se confirmando”, disse o secretário de Justiça do Maranhão, Raimundo Cutrim. Em São Luís, sete delegados investigam o que Meres denunciou.

Os depoimentos de Augusto e de José Gerardo foram muito proveitosos, na avaliação dos deputados da CPI. Se Augusto revelou a desconhecida propriedade da família no Maranhão, Gerardo, dono de empresas de ônibus em São Luís, conseguiu bater um recorde de contradições, mentiras e gafes, como quando admitiu que só ia trabalhar na Assembléia uma vez por semana e quando garantiu que era comum em todo o País o assédio sexual por homens públicos. Acusado de ter mandado matar o delegado maranhense Stênio Mendonça, fuzilado com cinco tiros quando investigava o roubo de carretas no Estado, Gerardo, apontado por Meres como o anjo da morte da quadrilha, disse que não conhecia Mendonça, para depois ouvir os deputados lerem pronunciamentos raivosos que fez da tribuna da Assembléia antes do crime, ameaçando o delegado. Assim como aconteceu com Augusto Farias, os sigilos bancário, fiscal e telefônico de Gerardo foram quebrados. Ele voltará a depor à CPI, desta vez em São Luís e não mais como convidado. Será testemunha. Se mentir, pode sair preso por injúria.