A "banda diagonal endógena" não foi a única contribuição da breve passagem de Francisco Lopes pela presidência do Banco Central. Os 20 dias em que esteve no comando do sistema financeiro brasileiro serviram também para explicitar o que alguns já suspeitavam: há algo de podre por trás das respeitáveis imagens do mercado e do poder público. As relações beiram a promiscuidade, confundem-se e misturam-se, graças ao confortável manto da impunidade, da inoperância dos mecanismos de fiscalização e da proteção dos sigilos bancário e fiscal. O Brasil acompanha estarrecido os desdobramentos das investigações do caso Marka, como as evidências de que Lopes coordenava as operações da consultoria Macrométrica ao mesmo tempo que presidia o próprio BC. E mais: teria dinheiro, não declarado ao Fisco, à sua espera num paraíso fiscal.

A CPI dos Bancos tem a grande chance de, a partir deste escândalo, puxar o fio da meada e desvendar as ligações obscuras entre a autarquia responsável por fiscalizar o sistema financeiro e os próprios investidores. Os banqueiros Salvatore Cacciola, do Marka, e Luiz Antônio Gonçalves, do FonteCindam, admitiram que fizeram suas apostas de que a desvalorização do real ocorreria apenas em fevereiro apoiados nas análises das consultorias MCM e Tendências, conhecidas balizadoras do mercado. Deram um tiro no próprio pé por confiarem demais no trânsito de informações entre governo e analistas, que normalmente exibem como credencial esse conhecimento dos meandros do poder. As duas consultorias foram criadas pelo ex-ministro da Fazenda Maílson da Nóbrega. Na MCM, que tem como clientes quase todas as instituições financeiras que operam no País, desponta o nome do ex-diretor do Banco Central Alkimar Moura como consultor especial. Já na Tendências, o próprio Maílson faz dobradinha com o ex-presidente do BC Gustavo Loyola.

Como bem lembrou Armínio Fraga, é possível provar-se que houve vazamento, mas é impossível provar que ele não tenha ocorrido – especialmente num país onde a quarentena ainda é uma discussão quase acadêmica. Agora se percebe que é preciso muito mais do que simplesmente criar leis para regulamentar a passagem de altos funcionários públicos para a iniciativa privada. É necessário moralizar todo o sistema. E a CPI é um bom caminho para começar essa transformação.