Grizzana entrou para a história por ter sido palco de uma sangrenta chacina promovida pelos nazistas. Muita gente, no entanto, com razão prefere associar seu nome aos óleos do pintor bolonhês Giorgio Morandi, que passava o verão na pequena cidade ao Norte da Itália e costumava registrar em tons pastel as colinas que via da janela. Uma das telas, Paisagem com casa rústica (1944), pode ser apreciada na mostra Arte italiana do entre guerras, em cartaz na Pinacoteca do Estado, em São Paulo. Junto a mais 81 pinturas e esculturas, a obra-prima de Morandi – um dos maiores artistas peninsulares deste século – faz parte de um amplo panorama do que se produziu na Itália durante o regime fascista. É lugar-comum afirmar que, à exceção dos mestres Morandi, Giorgio De Chirico e alguns gatos-pingados, o que saía dos ateliês naquela época não passava de arte sem vigor, francamente a serviço de uma ideologia nacionalista. Segundo a curadora Mariaestela Margozzi, da Galleria Nazionale d’Arte Moderna di Roma, de cujo acervo foi organizada a mostra, esta visão é hoje equivocada. "Estudos recentes desta produção, erroneamente colocada num caldeirão e jogada fora, mostram que estes artistas conseguiram chegar a grandes resultados estéticos através de uma iconografia simples e quase banal."

Com obras de 62 artistas, produzidas entre as décadas de 20 e 40, a exposição faz um apanhado geral dos movimentos e dos grupos artísticos que floresceram no período, revelando uma grande variedade de estilos e temas. Todas as linhas estéticas estão representadas. A começar pela chamada pintura metafísica, que revelou De Chirico e Morandi, até o perseguido movimento Corrente, de linha antifascista, passando pelo Novecento, considerado a tradução visual do regime com sua evocação do passado. Do pré-surrealista De Chirico foram escolhidas Lucrécia (1922) e A grávida (1923), cópia de uma tela de Rafael, obras da fase em que o artista se voltou para os mestres do Renascimento. Contando com Carlo Carrà, representado pelo quadro Mulher com cão (1938), e Giacomo Balla, já distante dos tempos futuristas com sua Louramorena (1926), pelo menos dois outros artistas merecem atenção especial. Um deles é Mario Sironi, maior expoente do Novecento, cujo Estudo de nu (1926) anuncia um estilo inclinado ao monumental. O outro é Renato Guttuso com as telas Fuzilamento no campo (1938), dedicada à memória do poeta espanhol Federico García Lorca, e Garotas em Palermo (1940), citação direta à tela de Picasso, Les demoiselles d’Avignon. O maior mérito da mostra, contudo, é revelar que, mesmo dividido entre as correntes de vanguarda e as obras voltadas para um passado artístico italiano glorioso, o período gerou grandes talentos.