Há dois anos, a marchande italiana Anna di Giusto estava relaxando em seu apartamento na refinada Vielle Ville, em Genebra, quando assistiu a uma reportagem na televisão sobre crianças carentes em todo o mundo. Acostumada a viajar pelo planeta, a senhora Di Giusto já havia visto muitas cenas de pobreza. Mas deu um clique na cabeça da mulher, que reside na Suíça desde menina. Ela vendeu a sua galeria de arte e instalou na sua casa, em meio a dezenas de quadros e antiguidades, o quartel-general de um projeto ambicioso: cuidar de crianças carentes em terras distantes. A conselho de uma amiga, ela se decidiu pelo Brasil, país onde estivera apenas uma vez, há 20 anos, como turista. Criou, então, a Associação Anna Di Giusto pela Infância, em que pretende investir do seu próprio bolso US$ 2 milhões no projeto piloto, a Vila da Criança, uma fazenda-escola auto-sustentável para 100 crianças. Pode até parecer um “projeto-de-madame-entediada-com-a-modorrenta-rotina-suíça” que decidiu se entreter. Mas não parece ser o caso. “Sou uma pessoa que sempre quis ajudar aos necessitados, mas que acabou sendo levada ao mundo dos negócios”, disse Anna a ISTOÉ. “Vou usar minha experiência profissional para retomar minha vocação.”

Aos 54 anos, divorciada, Anna é um trator humano. Nos últimos meses, trabalha 12 horas por dia para arrecadar fundos. Com uma rede de contatos construída como marchande em Genebra, ela atraiu a alta sociedade suíça, além de banqueiros, autoridades e artistas. O resultado foi visto na sexta-feira 15, quando o Hotel Intercontinental de Genebra foi palco de um baile de ga-la em prol da associação. A patrona foi a alta co-missária pelos direitos hu-manos da ONU e ex-presidente da República da Ir-landa, Mary Ro-binson – que também é pre-sidente de honra da asso-cia-ção. A con-ceituada Chris-tie’s comandou o leilão de 43 quadros, esculturas, jóias e até diárias em hotéis suíços. Uma das atra–ções foi um relógio de bolso de ouro bran-co incrustado com 95 diamantes doado pela Bedat & Co.

A sede da primeira Vila da Criança ainda não foi escolhida. Anna veio ao Brasil em março deste ano disposta a desembolsar cerca de US$ 150 mil na compra de um terreno em Muriaé, em Minas Gerais. Achou a área muito acidentada e desistiu do negócio. O padre italiano, Lorenzo Zorza, residente em Nova York ofereceu gratuitamente 10 dos 250 hectares da propriedade da igreja em Belém do Pará, que ele administra. A idéia é montar um orfanato numa fazenda, onde as crianças a partir dos cinco anos de idade teriam educação, trabalhariam na agricultura e aprenderiam outros ofícios até atingirem a maioridade. Os detalhes do projeto ainda são nebulosos. Porém Anna diz que a prioridade é conseguir o dinheiro. “Tenho de ir resolvendo as coisas gradualmente, senão fico maluca”, diz ela. Mas Anna não disfarçou a frustração com a recepção fria dos diplomatas brasileiros na Suíça. O chefe da chancelaria em Berna, Paulo Traballi Bozzi, afirmou que “o embaixador não pôde ir à reunião com Anna, mas que a embaixada está aberta se ela quiser conversar”. A marchande retrucou: “Tinha gente que não me levou a sério, mas agora que as coisas estão progredindo, me vêem com respeito.” E prometeu: “Vou ainda levar o meu projeto para o presidente do Brasil. Sei que ele vai me apoiar.” FHC que se prepare.


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