"Viajar é fatal para discriminação, intolerância e falta de visão" – Mark Twain
 

Desde que me conheço por gente, tive o privilégio de viajar. Meus pais, que por dez anos planejaram a primeira volta ao mundo, eram sábios neste sentido. Eles me mandavam para os Estados Unidos desde os seis anos de idade (sozinho), para passar as férias de julho com meus avós. Aos 15 anos, embarquei no que se tornaria uma viagem de dez anos fora do Brasil.

Desde então, morei em Boca Raton (Flórida), Nova York, Los Angeles, Bombinhas, Rio de Janeiro, São Paulo e, mais recentemente, Salvador. Mas, mesmo assim, tive momentos em que me deixei formar (ou deformar) pelo ambiente em que estava.

Semana passada, reencontrei um amigo de longa data, em São Paulo. Quando contei que estava morando na Bahia, sua reação foi de espanto: como você pode sair de São Paulo e ir morar no fim do mundo? A vida do Brasil está toda aqui! Minha primeira reação foi de espanto também! Queria muito falar pra ele que, quando me mudei de volta para o Brasil em 1994, após passar 10 anos fora, me espantei quando soube que tinha gente que era assaltada a mão armada dentro de seus carros. Que minha esposa, americana, ficava chocada com as criancinhas pedindo dinheiro nas esquinas. Que não achava normal demorar até uma hora para percorrer 5 quilômetros no trânsito. Que meus amigos nos Estados Unidos tinham carros que não eram blindados. Que as pessoas andavam na rua, à noite, sem medo.

Mas antes de abrir a boca, tive um daqueles momentos raros, em que conseguimos evitar falar o que pensamos e nos perguntamos: porque estou pensando isso? E me dei conta de que, tanto eu como meu amigo, estávamos cometendo o mesmo erro: achávamos que nosso umbigo era o centro do mundo. Nossa necessidade de adaptação nos alinha aos valores, à cultura e à tradição do lugar. E isso é bom, pois nos ajuda a conviver melhor. Uma das coisas mais difíceis é conseguir, depois de algum tempo morando em algum lugar, se lembrar que mundo vai além do nosso umbigo.

Viajar certamente é uma forma de se olhar além do horizonte. A exposição a diferentes culturas nos ajuda a ver, na prática, como somos diferentes.  O que é certo para um Indiano pode ser uma falta grande para um Peruano e vice-versa. E não precisa ir muito longe. Dentro do Brasil também podemos encontrar vários exemplos similares. Mas viajar não é o único nem o melhor caminho. A meu ver, a melhor forma de evitar preconceitos e discriminação é você se lembrar, constantemente, de duas coisas.

1 – existem poucas verdades absolutas. Toda vez que você se apega demais a uma delas, automaticamente está decidindo (dec(i)dere = de + cortar fora) eliminar as demais. E corre um sério risco de se alienar do fato de que o mundo é muito maior do que sua cabeça é capaz de compreender.

2 – o mais importante na sua vida não é aonde você mora, de que religião é ou quanto tem no banco. O que mais importa é quem você é. Seus valores, conhecimento, ética, compaixão são sua essência. E isso ninguém tira de você.