Das peças de roupa que as produtoras de moda da revista Trip carregaram no mês passado através dos portões do presídio do Carandiru, em São Paulo, foram as calças que chamaram a atenção dos agentes penitenciários. Presos são obrigados a usar calças beges. Se uma de outra cor ficasse em poder deles, uma fuga poderia ser facilitada. Depois de alguma conversa, ficou acertado que as calças levadas seriam cuidadosamente contadas na entrada e na saída de cada dia de visita. Na edição deste mês da revista, entre 17 detentos fotografados, lá estão calças gelo, cinza-chumbo, marrom-café, azul-anil. A cinza-chumbo é usada por Fernando Lopes de Oliveira, 53 anos, que, envergando um elegante terno de R$ 890, poderia facilmente passar por delegado de polícia, se não vivesse ainda numa cela. Condenado por assalto a banco, cumpre o fim de sua pena de dois anos.

Essa não é a primeira vez que a Trip foge à linguagem usual dos ensaios de moda para se aproximar de uma estética à la propaganda da Benetton. Há seis meses, a revista colocou roupas de griffe em salva-vidas cariocas. Depois vieram os pantaneiros. Há dois meses, foi a vez dos paraplégicos virarem modelos. Mas o trabalho no Carandiru é certamente um dos mais surpreendentes. “Tinha a impressão que ia ser difícil fazer um editorial de moda com os presos. Mas eles foram bem receptivos, se sentiram valorizados com o tom alto-astral da matéria”, conta Fred Melo Paiva, diretor de redação da Trip. A receptividade não foi imediata. Antes da reportagem, Fred teve de obter a aprovação dos líderes dos sete pavilhões do Carandiru. Sentou-se com eles por três horas até receber o OK. O detento “Carioca”, do comando de um dos pavilhões e preso por assassinato, foi o anfitrião do pessoal da revista. Com ele e um funcionário do presídio, Fred circulou por todos os pavilhões e colheu depoimentos de presos que, além de servirem de modelo, são personagens na reportagem. “Queremos tornar a moda mais real, mostrando pessoas reais dentro do ambiente em que vivem”, explica. No ensaio, as celas aparecem como são e os detentos misturam suas roupas pessoais às de griffe. A personalidade de cada um também foi levada em consideração na escolha das roupas. “O seu Fernando, por exemplo, é um cara educado, fala baixo, um bandido de estilo. O terno tem tudo a ver com ele”, avalia o jornalista. Resta saber o veredicto dos consumidores de moda.