Jardim Ângela, zona sul, São Paulo. Até junho deste ano 128 pessoas foram mortas lá, número que mantém o bairro como o mais violento da cidade mais violenta do Brasil. Nesse cenário, 31 jovens comparecem, na parte da manhã, à igreja São Francisco de Assis, numa das quebradas daquela periferia. E não é para rezar. Ou é, mas de uma forma diferente. Com o apoio do Programa Comunidade Solidária, há três meses estes adolescentes estão aprendendo em um curso a usar sua criatividade através de uma arte contemporânea. Duas vitrolas velhas, um mixer e uma coleção de discos velhos são os instrumentos para a moçada aprender a ser DJ. “Acordo às cinco da manhã e levo duas horas para chegar aqui, mas vale a pena. Meu sonho é animar as festas”, diz Augusto Fernando, 17 anos. Ele soube da oficina por uma assistente social, quando estava em liberdade assistida. Augusto foi preso por participar de um furto. “Hoje estou mais calmo. Acho que fazer um curso como esse dá mais responsabilidade”, avalia.

Disc-jóquei hoje é profissão glamourosa, ganha bem, viaja para o Exterior e aparece até em capa de revista. Considerado um dos melhores do Brasil, Mar-ky Mark, 26 anos, marcou presença na igreja na terça-feira 26, para delírio dos alunos. “Acho legal a humildade dele em vir aqui, incentivar a gente a continuar treinando”, diz Wil-lian da Silva, 15 anos, um dos mais empolgados com a oficina do craque em scratches e mixagens. Mas antes de ser o DJ residente de grandes casas noturnas, ganhar cerca de R$ 1 mil por apresentação e ir a Londres uma vez por mês, Marky Mark era Marco Antônio da Silva, garoto da Penha, bairro da zona leste da cidade. “Sou da periferia e não tenho vergonha disso. Aliás, acho que a periferia assimila primeiro o que é underground, e isso é bom para um DJ”, afirma ele. “Também acho bacana que trabalhos como esse sejam rea-lizados para ajudar o pessoal a sair da vagabundagem.” Ser vagabundo não é exatamente uma opção para os jovens do Jardim Ângela. “Aqui não tem lazer nenhum. Por isso nossa idéia é mostrar que não é só na droga que existe fantasia”, afirma o psicólogo Joel Costa, 30 anos, integrante da Sociedade Santos Mártires, promotora do curso.

Joel afirma que a escolha da oficina de DJ seguiu a vontade da juventude local. “A linguagem do DJ é alternativa, criativa. Assim como deve ser o jovem nascido aqui. Sem criatividade tudo fica mais difícil”, acredita. O sucesso é total. Não há mais vagas e, segundo o DJ Zinho, que ministra o curso diariamente, tem aluno querendo ficar seis horas mexendo nas pick-ups. “Acho tudo maravilhoso. Para mim, que não tenho muito o que fazer por aqui, foi uma oportunidade e tanto. Até aprendi técnicas como o scratch e a batida”, diz a estudante Glaudiene de Souza, 16 anos, considerada a aluna-revelação. “Eu queria ser modelo, mas se der para ser DJ, tô dentro.”