O final do ano está chegando. Apesar da correria, tenho certeza de que se as pessoas encontram tempo para compras, certamente podem encontrar um espaço na agenda para ampliar seus conhecimentos sobre arte. Recomendo três novas exposições do MASP, museu que considero um dos mais interessantes do mundo e que está bem aqui em São Paulo, em plena Avenida Paulista. São elas:

1- Judith Lauand – Judith Lauand (1922, Pontal, SP) recebe o destaque merecido para a comemoração de seus 100 anos de vida. A artista é uma figura fundamental na história da arte brasileira. Participou da histórica 1ª Exposição Nacional de Arte Concreta (1956-57) e foi a única mulher a integrar o importante Grupo Ruptura, que consolidou o movimento da arte concreta e da abstração geométrica no Brasil no meio do século passado. A mostra ocupa o primeiro andar do museu e apresenta 124 obras, fazendo uma sensacional revisão da trajetória de mais de sete décadas da primeira artista concreta do Brasil.

Judith graduou-se em Artes Plásticas pela Escola de Belas Artes de Araraquara e começou sua trajetória pintando natureza-morta. Certo dia, ao se distanciar da tela para ver como tinha ficado a pintura, viu um quadro abstrato ao associar o prato a vários círculos, a garrafa a um triângulo, a mesa a um retângulo. Sendo assim, pode-se dizer que sua pintura abstrata começou a partir de formas da natureza. Para além dos dogmas do concretismo em que havia se iniciado, a artista concebeu um dinamismo muito próprio, criando novas relações entre formas, linhas e cores, transcendendo regras e convenções da época. Apesar do rigor formal que empregou em suas composições, o ritmo e o movimento nunca desapareceram de seus trabalhos.

A mostra individual Judith Lauand tem curadoria especial de Adriano Pedrosa (diretor artístico do MASP) e de Fernando Oliva, com assistência de Matheus de Andrade. Segundo eles, “tanto a narrativa da exposição quanto os ensaios de seu respectivo catálogo apontam para o fato de haver, desde cedo em seu percurso, uma propensão à geometria e ao abstracionismo”. “Mesmo em suas primeiras produções, nota-se que, apesar de figurativa, ela já fugia dos maneirismos acadêmicos mais tradicionais e das repetições estilísticas”, diz Fernando Oliva.

Nessa linha, a exposição pretende ainda abordar novas perspectivas em sua obra, reforçando a presença de questões políticas como a repressão da ditadura militar no Brasil, a guerra do Vietnã e a condição da mulher na sociedade brasileira, quando a artista atravessa temas como violência, sexualidade, submissão e liberdade feminina. A exposição vai até 22 de abril de 2023.

 2-  Aline Motta – O MASP apresenta a Sala de Vídeo de Aline Motta (1974, Niterói, RJ), artista que utiliza ficção e poesia em vídeos para analisar apagamentos históricos da identidade brasileira. Está sendo apresentada a trilogia de vídeos: ‘Pontes sobre abismos’ (2017), ‘Se o mar tivesse varandas’ (2017) e (Outros) ‘Fundamentos’ (2017-2019). Com curadoria de Leandro Muniz, assistente curatorial do MASP, os projetos dialogam com parte da história familiar da artista, como um estudo de caso sobre a formação social brasileira e, sobretudo, seus apagamentos, violências e resistências.

Trabalha com desenho, escrita, performance, fotografia e vídeo, tomando a história de sua família como estudo de caso da formação social brasileira, com seus apagamentos, violências e resistências. Suas obras reconfiguram memórias — em especial as afro-atlânticas —, em uma abordagem interseccional sobre questões de gênero, raça e classe. Descendente de negros e brancos, Aline busca compreender como a história é narrada, em especial aquilo que é omitido ou reprimido e que ela recupera por meio da pesquisa e da especulação. Para tanto, constrói narrativas que evocam uma experiência não linear do tempo, na tentativa de questionar, por meio da pesquisa e da especulação, as relações entre violências estruturais, apagamentos históricos e a preservação da memória. A exposição acontece até 22 de janeiro de 2023.

3- Madalena Santos Reinbolt Pela primeira vez, o trabalho da artista baiana autodidata (1919 –1977) está sendo apresentado em uma mostra individual. O MASP apresenta 44 pinturas e tapeçarias. Com curadoria de Amanda Carneiro e André Mesquita, curador do MASP, a exposição mostra a subjetividade imaginada da artista baiana por meio de um vasto mundo de personagens, paisagens e situações do cotidiano.

Embora conectada desde muito cedo ao exercício criativo, foi somente nos anos 1950 que a artista passou a se dedicar à produção de pinturas, traçando figuras sintéticas com pinceladas expressivas e utilizando suportes frágeis, como papel ou palha, indicando a importância da materialidade em sua produção. A exposição mostra trabalhos com grandes massas, com motivos esquemáticos e de onde pouco a pouco conformam-se os limites que ensejam as personagens, a fauna e a flora, as cidades, os parques, as igrejas e as lagoas – ambientes de sociabilidade que integram humanidade e natureza, de onde surgem seus enredos em narrativas reimaginadas.

Reinbolt não obteve autonomia financeira e tampouco reconhecimento de sua produção criativa. A artista produziu de forma solitária, em uma situação de intimidade e de evidente separação de classe das divisões de trabalho e do racismo estrutural, tão enraizados nas relações sociais no Brasil e que ainda impactam profundamente a posição da mulher negra na sociedade. Pouco reconhecida em vida, ainda hoje há um grande silêncio dos museus e espaços de arte em relação ao pioneirismo de sua produção, algo que a mostra no MASP espera diminuir na mostra que vai até 26 de fevereiro de 2023.

Vale a dica que o MASP é gratuito às terças-feiras. Para mais informações, acesse o site do museu. Se desejar saber mais sobre um artista ou se tiver uma boa história sobre arte para me contar, aguardo contato pelo Instagram Keka Consiglio, Facebook ou Twitter.