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Na terça-feira 11, o ministro do Desenvolvimento, Luiz Fernando Furlan, anunciou que o governo estuda mudanças das regras de câmbio para facilitar a vida dos exportadores e defendeu os empresários que estão reclamando do preço do dólar, deprimido abaixo dos R$ 2,80: “Eles têm razão.” No dia seguinte, em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, o ministro subiu o tom. Criticando a eficácia da política monetária, Furlan deixou transparecer as divergências internas a respeito do tema e causou um grande mal-estar dentro do governo. “O problema é que a maior parte da inflação brasileira é causada pelas tarifas públicas e pelos preços reajustados por contrato. Contra esse segmento não adiantam juros altos”, afirmou. O ministro, que comemorou o saldo histórico de US$ 32 bilhões na balança comer-
cial de 2004, antevê resultados menos brilhantes por conta do real caro, que deixa os produtos brasileiros menos competitivos lá fora. O custo da valorização é incerto. “Só em julho estaremos em condições de contabilizar os estragos em consequência do câmbio inadequado de hoje”, disse o ministro. Dentro do grupo exportador, a turma do agronegócio anda ainda mais preocupada. Além do dólar em queda, os preços de commodities importantes, como a soja, também caíram. Os bancos estimam que as exportações ainda produzirão divisas da ordem de US$ 25 bilhões, um saldo suficiente para garantir equilíbrio nas contas externas do País em 2005. O problema está no médio prazo. O Brasil estaria perdendo a chance de pavimentar sua vocação exportadora, virando de vez a página da dependência excessiva de financiamentos externos. “É um problema grave”, diz o deputado-economista e ex-ministro Delfim Netto (PP-SP). Banco Central e Tesouro Nacional, juntos, já compraram mais de US$ 4 bilhões, principalmente no final do ano, mas as cotações continuam enterradas. Para muitos economistas, o BC demorou a agir, contando com a queda do dólar como força auxiliar no combate à inflação. É nesta seara que está o segundo nó que amarra as preocupações da indústria e do comércio.

Na reunião do Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom), nesta quarta-feira 19, espera-se nova elevação de meio ponto porcentual na taxa de juros, passando-a para 18,25% ao ano. “O Banco Central insiste em uma meta de inflação ambiciosa demais”, diz o ex-diretor do BC Carlos Thadeu de Freitas, referindo-se à inflação de 5,1% que o banco mira neste ano. “Quase metade dessa inflação vai se realizar no primeiro trimestre do ano, por causa de aumentos previstos, como o das mensalidades escolares. Vai estourar”, diz. Thadeu de Freitas calcula uma expansão do PIB de 3,5% neste ano, podendo ser menor se o BC insistir no juro alto até o segundo semestre. Ele sugere que o BC aceite uma taxa na casa de 5,5% a 6%, o que daria espaço para uma queda nos juros. Outro ex-diretor do BC, Sérgio Werlang, acredita que boas notícias poderão ajudar o BC a cumprir sua meta, aliviando os juros: “Há chances de que o preço da gasolina caia, assim como o da energia elétrica”, diz.

O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) aponta crescimento de 3,8% neste ano. Seu diretor de macroeconomia, Paulo Levy, está concentrado em outro aspecto da gestão econômica. “Houve uma forte expansão nos gastos correntes (despesas com pessoal e dia-a-dia da máquina)”, diz ele. As despesas do governo se elevaram em 10%, consumindo parte do aumento de arrecadação, e muito pouco do dinheiro extra pingou no financiamento de novas obras. “Deveria ser feito um superávit mais vigoroso para abrir espaço para redução das taxas de juro”, diz Levy. Sérgio Werlang se preocupa com o atraso na implementação das chamadas reformas microeconômicas, que integram uma minuciosa agenda preparada pelo Ministério da Fazenda. “Temas como a reforma do Judiciário, a nova lei de biossegurança (que trata de transgênicos e células-tronco) e o fortalecimento das agências reguladoras estão parados. Me preocupa ainda a demora do governo em sancionar a nova lei de falências”, diz o economista, hoje dirigente do Banco Itaú. Werlang também observa com atenção o comportamento dos juros americanos. Se subirem mais rápido neste ano, a economia brasileira pode levar um tranco. Ressalvas à parte, o que se espera é uma expansão econômica satisfatória em 2005. Números mais exuberantes, no entanto, ainda dependem da solução de alguns nós-cegos da economia brasileira.