Na Mata Atlântica e no cerrado paulista – faixa de vegetação rasteira típica do interior de São Paulo – estão depositadas algumas esperanças da medicina brasileira. Cerca de 300 tipos de plantas dessas regiões foram analisados por farmacêuticos e botânicos do projeto Biota, um programa que há mais de um ano faz o levantamento da flora local. Patrocinada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), a equipe encontrou seis espécies com propriedades antifúngicas, antitumorais e antioxidantes (combatem o envelhecimento das células). Uma delas também apresentou resultados contra a doença de Chagas.
Parte das descobertas está sob sigilo porque as substâncias encontradas pelo Biota requerem patentes reconhecidas internacionalmente, um processo complexo e demorado. Ou seja, ainda vai levar muito tempo para que as propriedades químicas das plantas sejam aproveitadas pela população na forma de remédios. “Existe um processo longo a ser percorrido entre a pesquisa e o medicamento. Por enquanto, estamos tratando de patentes”, explica a farmacêutica Vanderlan Bolzani, professora do Instituto de Química da Universidade Estadual Paulista (Unesp), em Araraquara, interior de São Paulo. “Fizemos testes preliminares com 300 espécies e selecionamos uma dúzia de plantas com substâncias interessantes”, conta Vanderlan. É o caso de um vegetal do grupo das rubiáceas (família do café) com ação antioxidante. Os nomes das plantas, entretanto, não são revelados. Apenas dois foram divulgados: Rauvolfia sellowii (mais conhecida como casca-de-anta) e Aspidosperma olivaceum (ou peroba). A primeira espécie é parente próxima de um gênero asiático que produz a reserpina, substância aproveitada em medicamentos para tratar de distúrbios nervosos. A peroba, também chamada de guatambu, apresentou ação antibiótica.
O segredo em torno das plantas é importante para impedir que outros cientistas registrem as propriedades químicas detectadas pelo Biota. Para se ter uma idéia de como o sigilo é fundamental nessa hora, basta dizer que os especialistas do projeto identificaram ação antitumoral na planta guaçatonga, comum do Rio Grande do Sul à região amazônica. No momento de entrar com o pedido de patente, os pesquisadores descobriram que japoneses solicitaram primeiro, em 1998, o direito de explorar industrialmente a propriedade química da espécie.

Independentemente do tempo necessário para obter as patentes, a rotina dos pesquisadores do Biota não se altera. Eles continuam recolhendo espécies no meio do mato. É uma vida corrida. Especialistas se penduram em árvores e dormem em regiões povoadas de pernilongos. Tudo em nome da ciência. Outro problema que o projeto Biota tem de contornar é o processo de destruição dos ambientes pesquisados. “Por enquanto, a grande devastação promovida nessas regiões ao longo de 500 anos não impediu a descoberta dessas substâncias”, comemora Vanderlan. Apesar das dificuldades, o programa de pesquisa confirma a crença popular de que o verde é a cor da esperança.