A palavra Inhotim surgiu da maneira que a criadagem chamava um minerador inglês que morou nos arredores de Belo Horizonte no século XIX: sinhô Tim. O tempo passou e esse termo, antes tão interiorano, ganhou o mundo das artes e tornou-se internacional – é hoje o nome de um dos mais originais museus do mundo, o Inhotim -Centro de Arte Contemporânea, localizado na área rural de Brumadinho, a cerca de 60 quilômetros da capital mineira – justamente onde ficavam as terras de Sinhô Tim. Além de possuir a maior coleção de arte contemporânea do País, com 400 obras de 80 artistas, o museu, criado em 2004, está plantado num autêntico paraíso ecológico, numa área verde de 400 hectares de mata nativa – e tem 40 hectares ocupados por jardins de espécies tropicais com a assinatura paisagística de Burle Marx. O idealizador desse tesouro é o colecionador Bernardo Paz, empresário dos setores de mineração e siderurgia, casado com a pintora carioca Adriana Varejão.

Até outubro do ano passado, Inhotim só era conhecido por alguns privilegiados. Aberto à visitação de quinta-feira a domingo, o museu viu a sua freqüência mensal crescer de dois mil para 12 mil visitantes em apenas oito meses. Segundo um estudo da empresa mineira de turismo Belotur, o lugar já está entre os quatro maiores destinos turísticos de Minas. E não sem motivo. Afinal, em qual outro museu do País se conseguiria ver uma das gigantescas instalações de Cildo Meireles com suas dimensões que ocupam uma sala inteira de um museu tradicional? Pois bem, em Inhotim há pelo menos três instalações de Cildo, entre elas Desvio para o vermelho, que reproduz um ambiente onde tudo, dos móveis ao canário vivo numa gaiola, é cor de sangue. “Esse museu é o único lugar do Brasil onde se pode ver a arte contemporânea em conjunto. Os estrangeiros chegam ao Brasil e vão direto para lá, ficam boquiabertos”, diz a galerista Luisa Strina, representante do artista.

Entre trilhas margeadas por lagos e fontes, essa espécie de “museu no meio do mato” compreende sete galerias de mil metros quadrados, uma delas inteiramente dedicada ao artista Tunga, um dos mais valorizados na arte contemporânea. Dele, o museu mineiro tem duas gigantescas instalações, como a celebrada True rouge (um lindo emaranhado de rede de pescar, tubos de ensaio, utensílios de limpeza e líquido vermelho). “Poderia ter na parede um Picasso de US$ 40 milhões, mas as pessoas passariam reto. Prefiro investir na arte contemporânea”, diz o colecionador Paz. Ele era dono de uma valiosa coleção de arte modernista, mas há 20 anos começou a se desfazer de seus Portinari, Guignard e Di Cavalcanti para formar o acervo contemporâneo que tira o fôlego dos visitantes de Inhotim. Agora são os próprios artistas que o procuram para desenvolver seus projetos ao “preço de custo”. Entre eles está o americano Matthew Barney, marido da cantora Björk, que vai instalar numa das colinas a escultura Da lama lâmina, formada por um trator e uma árvore. “Bernardo foi a primeira pessoa a construir um espaço para abrigar obras dessa dimensão e por isso Inhotim acabou virando uma vitrine. Para o artista, é mais interessante ver a sua obra exibida que armazenada”, diz André Millan, galerista paulista que representa Tunga. 400 obras de 80 artistas brasileiros e do Exterior compõem a coleção.

Segundo Millan, uma obra como True rouge vale cerca de R$ 500 mil. Pouco interessado no valor de mercado, Paz provoca: “Ela não vale nada, é feita apenas de vidros e rede.” Pura brincadeira. Ele está mais “interessado na capacidade das obras de transportar o visitante para outro tipo de experiência artística”. Na obra Forty part motet, da canadense Janet Cardiff, cada uma das 40 caixas de som reproduzem a voz de um cantor de coral. “No Guggenheim de Bilbao, entra-se e sai-se correndo. Aqui, chega- se de manhã e não se quer ir embora”, diz Paz. Outro projeto que promete é do americano Doug Aitken, que vai cavar um buraco de 300 metros de profundidade e instalar dentro dele um microfone de alta sensibilidade. Numa sala de vidro, na superfície, os visitantes poderão ouvir os “sons da Terra amplificados”. “Inhotim é uma coisa absolutamente maluca, mas se o Brasil tivesse uns dez malucos como Paz, estaria muito melhor”, diz Millan. O idealizador do projeto está atrás de parceiros para manter a instituição, hoje um instituto com ampla atividade cultural e didática. “Dediquei a minha vida a isso, mas está chegando o ponto em que o projeto sai de minha responsabilidade. Ele não pode ser meu, tem de ser público.” O público agradece.