Rita Lee é uma dinossaura radical. Podendo contar com o respaldo de outros jurássicos de peso como David Bowie, que se rendeu de capa e espada à música eletrônica, ela preferiu apenas flertar com o ritmo que atualmente dita as regras. Flertar é o verbo correto, porque só na primeira canção há algo do clima tecno sintetizado sob o título de 3001, que também batiza o álbum. Em seguida, uma releitura da histórica 2001, que abalou estruturas num velho festival de MPB, a atmosfera ganha cores rap-psicodélicas. Com sutis referências às irreverências musicais praticadas pelos Mutantes, regidos pela batuta vanguardista de Rogério Duprat, no final dos anos 60. As duas músicas são parcerias de Rita com Tom Zé, sendo que 3001 também ganhou a assinatura de Roberto de Carvalho. Depois de constatar como ela pintou e repintou as duas canções, dá até para imaginá-la dando a missão “moderna” por cumprida. Logo no início de Você vem, a faixa seguinte, começa o desfile roqueiro com uma primeira citação do megahit Jardins da Babilônia. Em toda a música, a guitarra genética do filho Beto Lee também dá dicas das reais intenções do novo disco.

Sob a direção de Roberto de Carvalho, que com talento e sensibilidade soube arquitetar um trabalho avançado sem ser modernoso e tradicional sem ser datado, 3001 é um alento em meio à enxurrada de pagode brilhoso e de pop pastoso que, com exceções, no momento se produz no Brasil. Com muita guitarra, baixo, bateria, alguns teclados e até uivos e latidos sampleados do cão Mike – aquele que há poucos meses fugiu e deixou Rita desesperada até encontrá-lo –, o CD ainda traz revigorada a verve humorística da cantora e compositora. Estava fazendo falta ouvir versos do tipo: “Nem toda feiticeira é corcunda/nem toda brasileira é bunda/meu peito não é de silicone/sou mais macho que muito home”, como ela entoa em Pagu, composta em parceria com a sempre bem-vinda Zélia Duncan, que faz uma participação especial. Longe de qualquer culpa ou perigo de exibir a possível artrite do rock’n’roll quarentão, aos 52 anos Rita Lee e sua habitual alegria-ironia fizeram um disco para titios, titias e, por que não, também modernos, levantarem da cadeira.