Numa manhã de maio de 1968, as paredes da Sorbonne, em Paris, amanheceram pintadas: “Não reivindicaremos nada. Não pediremos nada. Conquistaremos. Ocuparemos.” Naquele tempo, os estudantes, irreverentes, defendiam que se desse a palavra aos muros. E competiam, de forma anônima, pelos melhores slogans revolucionários. “Corre, camarada, o velho mundo está atrás de ti”, dizia uma parede. “O álcool mata, tomemos LSD”, respondia o muro ao lado. A cada dia, aqueles garotos se sentiam mais fortes. Até que um deles resolveu pichar os tijolos da universidade com uma mensagem, literalmente, incendiária: “E se queimássemos a Sorbonne?” Afinal, se era proibido proibir, por que não?

Passados 40 anos, ecos daquele maio de 68 foram ouvidos em Brasília. Estudantes ocuparam a reitoria da UnB, enfrentaram os seguranças e botaram para correr o reitor Timothy Mulholland, símbolo máximo – até agora – da farra com os cartões corporativos. Venceram, ponto final. Depois disso, mantiveram a reitoria ocupada por alguns dias e exigiram mais voz na eleição do futuro reitor. Para o ministro da Educação, Fernando Haddad, eles corriam o risco de transformar uma bela vitória numa grande derrota.

O maio de 68 ecoou em Brasília. Mas, desta vez, por sorte, não há mais ideologias

Pode ser. Mas a novidade desse “movimento estudantil de resultados”, que já desembarca na Universidade Federal de São Paulo, é a ausência de ideologias revolucionárias. Camisas de Che Guevara são raridade entre os jovens – eles preferem iPods. E a maioria exige apenas que não se gaste mais “o meu, o seu, o nosso dinheiro” com viagens à Disney, lixeiras cromadas e saca-rolhas de R$ 900. Quem há de ser contra?

Rebeldes sem causa são menos perigosos do que aqueles que carregam grandes bandeiras. José Dirceu, preso no congresso de Ibiúna em 1968, terminou denunciado como idealizador do Mensalão. Lindberg Farias, líder dos “caras-pintadas” em 1992, é hoje um prefeito petista investigado por licitações fraudadas. E mesmo os franceses já debocham do passado. Daniel Langlois, veterano daquela primavera de 68, acaba de lançar um best-seller chamado Slogans para as próximas revoluções. Eis alguns: “Façam amor, mas não nos corredores dos supermercados”, “Socorro, as eleições chegaram!”, “Se você já não sabe dizer não, ao menos diga Merda!”

Pensando bem, estudantes que nos protegem de reitores corruptos merecem crédito. E quando eles, velhos e barrigudos, começarem a contar as moedinhas do vil metal, que outros tomem seu lugar.

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