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Com seu terno de ombreira, topete de graúna e a gravata-borboleta do
tamanho de um skate, Zé Bonitinho diz tudo sobre o nosso "brazilian lover"

Nem em seus melhores sonhos um certo Jarbas, rapazote metido que ali pelo começo da década de 40 andava pelos bares cariocas olhando-se insistentemente nos espelhos das chapelarias, encantado com a própria figura e recitando para si mesmo frases como “Alô, garotas, cheguei”, imaginou que serviria de inspiração para um dos mais incríveis e longevos tipos da vasta galeria de personagens da risadaria brasileira. Seu amigo Jorge Loredo captou os trejeitos de Jarbas, que se autoproclamava “O perigote das mulheres”, muniu-se de uma peruca topetuda, um pente gigantesco e um bigodinho fino da malandragem da época para dar vida à mais perfeita paródia do brasileiro metido a gostoso e conquistador, dono de uma autoestima nem sempre proporcional à realidade ou aos seus dotes físicos, materiais e/ou intelectuais. O mais ilustre filho do dr. Jorge Loredo (sim, além de estudar teatro, inclusive com o mago da mímica Marcel Marceau, ele se formou em direito e exerceu a advocacia trabalhista ao longo de décadas) chama-se Zé Bonitinho. A alguns meses de completar 90 anos, Jorge continua saindo de sua casa no bairro de Santa Tereza para gravar participações impagáveis em programas humorísticos que não querem abrir mão do dono de bordões como “O chato não é ser bonito, o chato é ser gostoso”, fazendo esse cruzamento exótico com o rascunho tosco de Clark Gable e Costinha. Entrevistado pelo repórter Arthur Verissimo para uma edição da “Trip” especialmente dedicada ao humor, Jorge diz que nunca teve um milímetro da banca de seu personagem. “Que nada, Arthur, sempre fui tímido com as beldades”, responde o humorista. E acrescenta: “A maioria dos artistas e comediantes é introvertida por natureza. Meu mestre Oscarito parecia um professor de latim. Não gostava de ser engraçado pessoalmente. Os grandes humoristas e comediantes que conheci passaram por sofrimentos e tragédias. A maioria sofre ou sofreu bastante bullying e preconceito.”
Com seu primeiro filme rodado em 1959 e o mais recente em 2011 (“O Palhaço”, de Selton Mello), Loredo é certamente um dos atores de carreira mais longeva no Brasil.
O duro não é ser bonito… o duro é ter tanto talento. E por tanto tempo.

A coluna de Paulo Lima, fundador da editora Trip, é publicada quinzenalmente