Numa manobra certeira, o governista Partido Revolucionário Institucional (PRI), no poder no México há 70 anos, realizou no domingo 7 pela primeira vez eleições partidárias para escolher seu candidato ao pleito presidencial de julho do ano 2000. A manobra foi coordenada pelo presidente Ernesto Zedillo, que afirmou ter “amputado o dedo”, numa alusão à operação dedazo – os últimos 12 presidentes mexicanos foram apontados por seus antecessores. Na campanha intitulada “O novo PRI – mais perto de você”, o partido, que se autodenomina partido do povo, anunciou a prumada rumo à democracia. Nesta eleição histórica, os dez milhões de mexicanos (não apenas os membros do PRI) foram às urnas para decidir entre os quatro pré-candidatos do partido: o ex-ministro do Interior Francisco Labastida, o governador da Província de Tabasco, Roberto Madrazo Pintado, o ex-governador do Estado de Puebla Manuel Barlett e o ex-presidente do partido Manuel Roque de Villanueva.
 

Porém, o exercício democrático não resistiu à máquina governista: venceu Francisco Labastida, o candidato de Zedillo, eleito com 82,9% dos votos ou por carro completo, como dizem os mexicanos. Labastida, ex-ministro do Interior, 57 anos, ganhou 232 votos dos 300 distritos, deixando longe o segundo candidato, Madrazo, com apenas 19. Os três candidatos acusaram Labastida de favoritismo do governo. O presidente mexicano defendeu-se: “Ninguém que seja de boa-fé pode insinuar que houve uma inclinação minha por qualquer um dos candidatos.” Apesar da declaração e de não ter subido no palanque, o próprio Zedil-lo designou seu ministro de Desenvolvimento para conduzir a campanha de Labastida, que deverá seguir suas rédeas, sem mudanças bruscas na política econômica e social. Além da experiência de 37 anos de vida pública, com cargos como governador do Estado de Sinaloa (Nordeste do México) e embaixador em Portugal, Labastida percorre com desenvoltura os entrelaçados corredores do governo, onde há todos os tipos de acusação, de corrupção a envolvimento de escândalos no narcotráfico. Por isso mesmo, o vencedor afirmou durante a campanha que “o novo PRI está muito distante do caminho adotado por Carlos Salinas (1988-1994)”, presidente execrado pelos mexicanos, que não se esqueceram das falcatruas de seu irmão incômodo, Raúl Salinas, acusado de lavagem de US$ 87 milhões provenientes do narcotráfico.
 

Dedazo – Ernesto Zedillo não cortou seu dedo à toa. O presidente mexicano, que sofre de uma crescente impopularidade, teve dois temores: o avanço da oposição e um racha dentro de seu próprio partido. O fim do dedazo foi uma tentativa de equilibrar as forças do PRI, um mosaico político de sindicatos, tecnocratas e fortes líderes tanto da ala conservadora como da moderada. Durante a campanha, deu para se ter uma idéia da possível fragmentação do PRI. O próprio presidente, que assumiu o poder em 1994, sofreu duros golpes dos pré-candidatos que o acusaram de haver uma ditadura dentro do PRI. Não faltaram também trocas de farpas entre os principais rivais. Madrazo atacou Labastida dizendo que “o candidato oficial não mudará essas políticas falidas”. Labastida revidou chamando Madrazo de “duas caras e mentiroso”, deixando de presente para ele um livro do Pinocchio. Depois da derrota, Madrazo avisou que não deixará o partido, mas que também não ficará de boca calada. E ele poderá atrapalhar.
 

O temor de que a oposição cresça poderá até ter fundamento. Na última década, os partidos oposicionistas conquistaram 10 dos 31 Estados do México. Nas eleições para a Câmara dos Deputados em 1997, os mexicanos derrotaram a hegemonia histórica do PRI que ficou com 238 cadeiras contra 264 dos partidos oposicionistas. Nesta eleição, o grande vencedor foi o líder do esquerdista Partido da Revolução Democrática (PRD), Cuahtémoc Cárdenas. Cárdenas disputará as eleições presidenciais de 2000 com Labastida e o conservador Vicente Fox, do Partido de Ação Nacional (PAN). Dificilmente o candidato do PRI perderá essa parada. Vicente Fox é o que tem mais chances de derrotá-lo. Mas Labastida promete ser bom no ringue. Em uma de suas biografias, ele foi descrito como um bom boxeador, porque “resiste a golpes e emprega a técnica para responder de maneira fina. De alcance largo, prefere os golpes diretos, na cara”.