Em clima de virada do milênio, a 4ª Bienal Internacional de Arquitetura, que será aberta no sábado 20, no Pavilhão do Ibirapuera, em São Paulo, resolveu homenagear o passado voltando os olhos para o futuro. Ao lado das 35 salas nacionais e internacionais de caráter histórico – dedicadas a nomes fundamentais como Mies van der Rohe, Frank O. Gehry, Le Corbusier, Paulo Mendes da Rocha e Alvar Aalto, entre outros, sem falar das inúmeras mostras temáticas -, a bienal traz uma outra grande atração. Trata-se da réplica em escala real do laboratório americano que integrará a International Space Station (ISS), megaprojeto espacial de cooperação científica do qual o Brasil faz parte juntamente com mais 15 países. Construído pela Boeing e pela Nasa, o módulo do tamanho de um ônibus coletivo, pesando cerca de três mil quilos, permitirá que o visitante experimente um pouco do cotidiano dos astronautas que estarão desenvolvendo pesquisas científicas. A operação que consumiu cerca de R$ 800 mil, segundo Marcos Weinstock, diretor-executivo da Fundação Bienal de São Paulo, é uma promoção conjunta com a Rede Globo e Intelig, que patrocina o evento com apoio da Agência Espacial Brasileira e do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). A organização prevê um público de 250 mil pessoas, cinco vezes mais que o da edição anterior. Dentro da programação variada, um dos destaques é a sala dedicada ao arquiteto alemão Mies van der Rohe, autor da Torre de Cristal, projeto de 1922 não executado, e do famoso Pavilhão Alemão da Exposição Mundial de Barcelona, de 1929.

Mas a grande estrela da bienal, sem dúvida, será a International Space Station. Para Marcos Weinstock, curador da sala especial chamada Arquitetura no Espaço, a ISS é um acontecimento significativo dentro de uma nova visão arquitetônica. “A estação tem uma área equivalente a dois aviões Jumbo”, exulta. “É uma verdadeira construção, uma casa do espaço. As pessoas vão morar lá, como acontecia no filme 2001 – uma odisséia no espaço.” Só a vinda do protótipo da Nasa, que pela primeira vez sai dos Estados Unidos, já tornaria o acontecimento imperdível, mas para torná-lo ainda mais atraente a bienal concebeu juntamente com a Globo uma impressionante instalação, que funde mitos indígenas brasileiros a um visual de poesia futurista. Montada no andar térreo do Pavilhão da Bienal, a sala especial promete encantar crianças e adultos. Uma lenda recorrente em várias tribos brasileiras diz que ancestrais índios vieram do espaço, o que os tornaria os pri-meiros astronautas. Os caiapós, por exemplo, teriam descido à terra por um fio através de um buraco no céu. Os que não conseguiram, ficaram no espaço e acenderam fogueiras que viraram estrelas. Foi a partir do potencial poético destas narrativas sugeridas pela curadoria que o diretor de arte Mário Monteiro, criador das cidades cenográficas das novelas globais, bolou o trajeto da sala especial – uma taba high tech de 710 metros quadrados, que pretende ilustrar, numa espécie de túnel do tempo, o encontro do silvícola com seus antepassados.

Índios e astronautas – Depois de passar por corredores simulando florestas através de folhas, cheiros, luzes, gelo seco e música composta por André Abujamra, o visitante se depara com um videowall no qual se projetam imagens espaciais. Chega-se, então, ao laboratório da Nasa, montado num praticável transparente a meio metro de altura para dar a ilusão de que a construção flutua, acentuada pelo ambiente escuro que lembra o céu estrelado de um planetário. Lá, o visitante poderá se sentir como um astronauta manipulando uma parafernália igual à que entrará em órbita. Ao abandonar o módulo, um desfecho a la Stanley Kubrick o espera. É onde acontece o simbólico encontro do mundo dos índios com o dos astronautas.

Esta é a segunda parceria entre a Globo e a Bienal de Arquitetura, que em 1997 criou uma sala especial mostrando a planta industrial do Projac, o complexo de estúdios construído em Jacarepaguá, Rio de Janeiro. De acordo com Mario Cohen, diretor da Central Globo de Comunicação, a nova promoção afina-se com a filosofia da emissora. “Nossa vocação de televisão é criar o envolvimento, tornar coisas impossíveis em possíveis, criar a oportunidade para que as pessoas sonhem.” Um sonho, aliás, concretizado em tempo recorde. Apesar de o projeto ter sido planejado há um ano, foi somente em setembro último que Marcos Weinstock teve a certeza de vê-lo realizado, quando visitou no Rio de Janeiro um simpósio no qual estavam presentes representantes da Nasa, da Boeing e do Inpe. “Peguei a maquete da estação espacial e levei para a Globo uns americanos com cara de Sean Connery e insígnias piscando no peito Nasa, Nasa, Nasa”, lembra Weinstock. “Quando eles disseram que já tinham todo o módulo pronto para usarmos, foi aquele silêncio completo.” Resta saber se o sonho brasileiro de ter dois astronautas no espaço vai se concretizar na mesma proporção.