O mercado de ensino privado está virando coisa de bilionários. Com a união entre as faculdades Kroton e Anhanguera, as duas maiores companhias do setor no País, anunciada na segunda-feira 22, foi criado o maior conglomerado educacional do mundo. O novo grupo está avaliado em cerca de R$ 12 bilhões, cifra que representa o dobro da segunda colocada, a chinesa New Oriental. “O negócio representa um marco e desencadeará uma série de grandes fusões entre as universidades privadas”, prevê André Cleto Carvalhaes, consultor financeiro da AC2 Investimentos. “Foi dada a largada para quem estava em processo de negociação”, diz. O acordo aprovado pelas diretorias prevê que a Kroton incorpore a Anhanguera em uma troca de ações estimada em R$ 5 bilhões. As faculdades cresceram rapidamente nos últimos anos em função dos incentivos governamentais para o ensino privado e das aquisições de companhias menores.

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FUNDADOR
Gabriel Rodrigues criou a Universidade
Anhembi Morumbi e articulou a fusão bilionária

O controle da nova companhia será disperso. Os acionistas da Anhanguera ficam com 42,52% das ações e, os acionistas da Kroton, com 57,48%. A fusão entre os grupos causou surpresa no mercado. Até o ano passado, o que se aguardava era a associação da Anhanguera com a carioca Estácio. Mas, nos últimos meses, essa possibilidade se desfez diante de rumores de que o grupo paulistano seria vendido a outro investidor. “Houve muita especulação no setor”, afirma Ricardo Scavazza, presidente da Anhanguera. A fusão com a Kroton havia sido descartada, já que até o ano passado era considerada uma faculdade de menor porte. Algumas mudanças políticas, no entanto, deram ao grupo o valor de mercado que detém hoje.

Em 2007, a Kroton abriu capital, dois anos depois passou a ter como sócio o fundo de participações Advent, que promoveu mudanças na gestão. Mais tarde, a empresa comprou a Iuni, rede de ensino de Cuiabá, criada por Altamiro Galindo. Seu filho, Rodrigo Galindo, que atua em instituições de ensino há 23 anos, foi escolhido para presidir a companhia e controlar as despesas do grupo. O passo maior da Kroton veio em 2011, com a compra da Universidade do Norte do Paraná (Unopar) por R$ 1,3 bilhão. Essa aquisição a levou para a liderança no ensino a distância do País. A Anhanguera, por sua vez, sempre liderou o setor da educação privada com a rede de ensino voltada às classes C e D. Mas, no mesmo ano em que a Kroton viu o seu valor de mercado crescer, a Anhanguera passou a enfrentar dificuldades financeiras com a aquisição da Uniban por R$ 510 milhões. Ainda assim, os dois grupos mantiveram posições de destaque entre as maiores empresas de educação do mundo na Bolsa de Valores e, em 2013, veio o momento oportuno para a fusão.

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FUTURO
Rodrigo Galindo, que veio da Kroton,
define os passos do novo gigante

A associação ainda precisa ser aprovada pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), mas já produziu alguns efeitos no mercado de educação do Brasil. De acordo com o diretor de pesquisa da Brasil Investimentos e Negócios, André Luiz Saconato, as fusões geram uma redução de custos operacionais vantajosa para o setor. “Ocorre uma simbiose, uma atuação complementar que obriga os concorrentes a fazerem o mesmo para conseguir oferecer as melhores condições ao público alvo”, explica. Um passo como esse, explica ele, pode fazer o governo ampliar os incentivos em direção à qualidade da educação. A união das empresas inaugura um novo ciclo para o setor também no que diz respeito à participação de agentes financeiros na gestão das instituições de ensino. Dos cinco maiores grupos educacionais brasileiros, que juntos reúnem cerca de 1,4 milhão de alunos, quatro são comandados por empresas do setor financeiro.

A nova faculdade também será direcionada aos alunos das classes C e D. Isso porque esse estrato social no País segue na mira dos investidores. “Poucos países no mundo têm o mesmo potencial de crescimento nesse setor que o Brasil”, ressalta Saconato. Os dados do último Censo revelaram que apenas 13% dos jovens em idade escolar estão matriculados nas faculdades. E apenas 9,3% da população com mais de 24 anos possui ensino superior. Nos Estados Unidos, o número sobe para 41% e, no Chile, 25% da população cursou o terceiro grau. Esses números dão uma ideia de quantas pessoas ainda não conseguiram chegar às faculdades. A possibilidade de acesso e as diversas unidades são, portanto, a fórmula de sucesso das redes privadas. Das 80 cidades em que atuarão, em apenas quatro haverá sobreposição das atividades. Pensando nesse filão, Galindo afirmou que uma das ferramentas para incrementar o número de estudantes matriculados nas universidades será o aumento de adesão ao Fundo de Financiamento Estudantil (Fies). Hoje, a Anhanguera tem 20% de seus alunos presenciais no Fies e a Kroton tem 45%.

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PARCEIRO
Ricardo Scavazza, da Anhanguera, vira acionista do grande grupo

Enquanto isso, o mercado já aposta que a Estácio se associe a outro grupo da educação para concorrer em boas condições com a Kroton e a Anhanguera. Uma das possibilidades é uma fusão entre a carioca e o grupo internacional Apollo, que tenta entrar no mercado brasileiro há algum tempo. “A Estácio tem potencial porque conhece as características do setor no País”, afirma o diretor de pesquisa da Brain Brasil. Sob o viés pedagógico, os especialistas não preveem uma melhora significativa. “O foco da negociação não foi em qualidade, a estratégia é em relação ao ingresso de novos estudantes”, observa Carvalhaes, da AC2 Investimentos. Entretanto, uma vez que um grande passo foi dado para ampliar as possibilidades, é provável que o governo passe a olhar mais cuidadosamente para a qualidade da educação.

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