Garimpar a obra de um músico em suas "tantas facetas, tantos perfis, tantas caretas esquecidas", como diz o próprio compositor e cantor baiano sobre este primoroso trabalho elaborado por Marcelo Fróes, não é tarefa das mais fáceis. A cada vez que um produtor, estrangeiro ou nacional, lança-se ao ofício, em geral costuma tropeçar nas inevitáveis versões de estúdio em que o artista errou, gravou e gravou outra vez, mas que, muito tempo depois, já famoso ou morto, "justifica" assim a inclusão destes takes em caixas destinadas a fãs inquestionáveis. Não é de forma alguma o caso de Ensaio geral, conjunto de dez CDs, três inéditos, dois dos quais duplos, em que Fróes praticou sua arqueologia nos arquivos da Philips, Phonogram, PolyGram – atual Universal – para trazer à tona momentos importantes de um dos maiores músicos brasileiros. Acondicionados numa bela caixa prateada, no formato dos antigos LPs, os dez CDs vêm acompanhados de um livro com textos de Fróes e do jornalista e "gilólogo" Carlos Rennó, recheado de fotos saborosíssimas de se olhar e relembrar. Lá estão, nas páginas e nas bolachinhas digitais, as cores e os sons sofisticados de um Gil que já surpreendia logo na estréia artística oficial, em 1967, com Louvação, Procissão e Lunik 9. Seguem-se o Gil tropicalista com o histórico álbum Gilberto Gil, de 1968 – o que tem Domingo no parque e Marginália II –, o Gil londrino cantando em inglês composições dele e de figuras sagradas do rock, e o Gil compositor para cinema com o até hoje inédito Copacabana mon amour, trilha sonora homônima para o filme de Rogério Sganzerla. Saído das escavações, há também o essencial Expresso 2222, de 1972, que marcou o retorno definitivo de Gilberto Gil ao Brasil, depois do exílio nada voluntário. Se é que é possível condensar genialidade, Ensaio geral o fez sem esconder qualquer possibilidade de modéstia. (A.R.)
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