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 A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que submete decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) ao Congresso foi recebida com críticas por integrantes da Corte. O texto foi aprovado nesta quarta-feira, 24,  pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados e ainda precisa ser analisada por uma comissão especial antes de seguir para votação no plenário. 

Para o ministro Gilmar Mendes, a submissão de decisões do Supremo a outros poderes “evoca coisas tenebrosas” do passado nacional. Ele lembrou que a Constituição de 1937, concebida no regime do Estado Novo de Getúlio Vargas, permitia a submissão de decisões do Judiciário ao presidente da República. “Acredito que não é um bom precedente. A Câmara vai acabar rejeitando isso”, afirmou. 

O ministro acrescentou que os movimentos do Legislativo contra o Supremo são marcados por “decepções e frustrações imediatas”, deixando entender que a proposta que tramita na Câmara é fruto do casuísmo de parlamentares que não concordam com decisões recentes do STF. “No momento seguinte, o tribunal decide por um outro sentido, que atende a determinado tipo de expectativa. É preciso ter muito cuidado com esse tipo de interação e acredito que, em geral, tem se sabido valorizar a democracia, o estado de direito e acredito que será assim que a Câmara encaminhará”, completou Mendes. 

Uma das modificações propostas pela PEC estabelece que quando o STF decidir pela inconstitucionalidade de uma emenda à Constituição, o Congresso poderá rever o ato do tribunal. Caso os parlamentares discordem da posição do Supremo, a questão seria decidida em um plebiscito popular. 

Na opinião do ministro Marco Aurélio Mello, a proposta vai contra uma das cláusulas pétreas da Constituição, que determina a separação entre os poderes. “Nós temos um sistema em que se verifica o primado do Judiciário. A última palavra não cabe ao setor político, cabe ao Judiciário, o órgão de cúpula, o guarda da Constituição”, disse o ministro. As cláusulas pétreas não podem ser alteradas por emendas, mas somente com a convocação de uma nova Assembleia Constituinte. 

Na mesma linha do colega, Marco Aurélio acredita que a proposta soa como uma retaliação por decisões tomadas recentemente pelo Supremo e que vão contra o interesse da maioria do Congresso e de setores específicos, sem nomear quais são essas decisões. “Quando o Supremo vota atendendo os anseios da maioria, muito bom. Mas ele (o Supremo) tem um histórico de decisões contramajoritárias. Nesse caso não, porque a sociedade aplaudiu o julgamento da AP 470 (mensalão). Agora, não há espaço para esta mesclagem, a meu ver imprópria, que é a submissão das decisões do Supremo a um órgão político. Não creio que para a sociedade brasileira, para o almejado avanço cultural, essa submissão dos atos do Supremo seja boa. Ao contrário. É perniciosa”, comentou. 

O texto aprovado pela comissão da Câmara também altera o quórum das decisões tomadas pelo Supremo. A proposta estabelece que para o STF declarar a inconstitucionalidade de uma norma, serão necessários votos de nove dos 11 ministros. Hoje bastam seis. 

A PEC ainda aumenta para quatro quintos a maioria necessária para a aprovação de súmulas vinculantes, um mecanismo que obriga juízes de todos os tribunais a seguirem o entendimento adotado pelo Supremo sobre determinado assunto com entendimento pacificado. Para aprovar uma súmula, o Supremo precisaria dos votos de pelo menos nove dos 11 ministros da corte. 

Marco Aurélio, conhecido por seus comentários irônicos, afirmou que o desejo dos deputados mascara uma tentativa de inviabilizar o trabalho dos ministros. Diante do quadro de quase unanimidade para aprovar súmulas e declarar a inconstitucionalidade de leis, o ministro afirmou que a proposta não terá como prosperar. “Quem sabe a utopia, a unanimidade. Teríamos que ouvir o Nelson Rodrigues no que dizia que toda unanimidade é burra”, disse.