Visitar o hábitat dos gorilas é uma experiência fascinante. O maior e mais forte dos primatas, que está em risco de extinção, vive num território montanhoso no coração da África, entre Uganda, Ruanda e o Congo. Habituado à presença de cerca de dez mil turistas ao ano, o bicho é dócil e encanta por sua expressão poderosa, quase humana. Só tem um problema. A região foi invadida por caçadores. Não caçadores de gorilas, o que já seria lamentável. Muito pior. Na semana passada, rebeldes da etnia hutu de Ruanda invadiram o Parque Nacional Bwindi, na vizinha Uganda, com o específico propósito de caçar turistas de origem anglo-saxônica. Conseguiram. Ao final da segunda-feira 1º, estavam mortos oito estrangeiros (quatro britânicos, um casal de americanos e duas neozelandesas), que, depois de viajarem pelo menos sete mil quilômetros para chegar àquelas montanhas, foram sequestrados e brutalmente assassinados a golpes de facão e machado. O motivo da barbárie era chamar a atenção para a causa hutu, que forma a maioria da população de Ruanda, mas desde os tempos coloniais é controlada pela minoria tutsi. "Eis a punição aos anglo-saxões, que nos venderam. Vocês protegem uma minoria e oprimem a maioria", dizia uma mensagem em francês deixada ao lado de dois corpos. Os países ocidentais, bem como Uganda, apóiam o governo tutsi de Ruanda.

A caçada teve início no alvorecer daquele dia. Entre 120 e 150 rebeldes, armados com rifles e granadas, invadiram uma área onde se concentram três acampamentos de turistas. "Tudo ocorreu depressa, e não houve muitos disparos", disse o piloto e operador de turismo americano Mark Ross, que foi acordado pelo barulho. Os rebeldes, membros da cruel milícia Interahamwe, que em 1994 liderou o genocídio em Ruanda de quase um milhão de tutsis, mataram quatro guardas florestais e começaram a arrancar os turistas de suas tendas, reunindo 31 deles numa clareira (alguns poucos conseguiram se esconder no mato). Pilharam tudo o que havia de valor e incendiaram uma cabana e quatro veículos do parque. Os turistas de fala inglesa, então, começaram a ser separados do resto dos estrangeiros.

Foi uma caminhada longa, com passo apertado, por trilhas estreitas do parque, também conhecido por Floresta Impenetrável. Logo no começo, a americana Linda Adams, 54 anos, simulou um ataque de asma e disse que não conseguiria continuar. Foi libertada. Os 14 turistas que continuaram, entre eles Ross, experimentariam o horror. Duas outras mulheres, incapazes de acompanhar o passo, foram retidas por alguns rebeldes. "Foram assassinadas ali mesmo. Uma parecia ter sido estuprada antes de morrer", lembrou Ross.

Por volta do meio-dia, os rebeldes escolheram as próximas vítimas: uma jovem neozelandesa, um britânico e um americano, marido de uma das mulheres assassinadas antes. Ross contou que mais tarde também encontrou seus corpos, com a cabeça esmagada e cortes profundos feitos com facões. Perto das 16 horas, depois de nove horas de terror, a caravana chegou à fronteira com o Congo. Seis turistas foram poupados para enviar uma mensagem aos países anglo-saxões. Entre os que escaparam da morte estava a suíça Deanja Walther, 26 anos, que havia se juntado aos sequestrados para ficar ao lado de um amigo. Em setembro, ela já driblara o destino ao deixar de embarcar no vôo da Swissair que caiu no mar perto da costa canadense.

O massacre pode representar um golpe mortal ao turismo da região. Afinal, quem vai querer voltar ao território desses primatas gigantes, que ficou famoso pelo filme A montanha dos gorilas, com Sigourney Weaver, sabendo que é capaz de perder a vida na brutalidade de uma guerra tribal?

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