A vida tem sido muito fácil para os bancos. Enquanto a indústria sofre com as elevadíssimas taxas de juros e o índice de desemprego na Grande São Paulo bate o recorde de 9,18% em janeiro, segundo o IBGE, as instituições financeiras deitam e rolam com a crise. Não bastasse seu excelente desempenho no ano passado – o HSBC Bamerindus chegou a contabilizar um lucro 220% melhor que o de 1997 –, muitos banqueiros aproveitaram bem a desvalorização do real em janeiro. Em apenas 30 dias, segundo dados preliminares do Sistema do Banco Central (Sisbacen), seus resultados cresceram até 4.030% sobre todo o segundo semestre de 1998, caso do Deutsche. No banco múltiplo do Citibank, a performance melhorou 550%. Os bancos sem dúvida estavam mais do que preparados para a mudança do câmbio. "Acontece que o Citi se protege contra variações das moedas nos 100 países onde atua. Sempre estamos vinculados ao dólar", justifica Alcides Amaral, presidente da instituição. O uso de hedge cambial, que garante que o dinheiro acompanhe a variação das cotações, é a resposta dos bancos para quem estranha tanta bonança em tempos magros. Mas o deputado federal Aloizio Mercadante (PT-SP) acha que a explicação pode ser outra. Ele já havia apontado para acesso a informações sigilosas do BC às vésperas de o real disparar. "Os ganhos de janeiro fazem parte da mesma história. O governo não pode ficar imobilizado e assistir a um ataque especulativo, enquanto instituições financeiras atuam com desinibição no mercado", critica.

O assunto é delicado. "O que você acha, meu filho? É difícil provar", responde o consultor Carlos Coradi. O fato é que num país onde o governo não dá brecha para o aumento da produção, as instituições financeiras são o melhor negócio. Com ou sem informação sigilosa. Mas nem sempre o correntista se beneficia de tamanho sucesso. O Unibanco defendeu muito bem o patrimônio próprio de R$ 2,7 bilhões e garantiu um lucro de R$ 85,2 milhões. "Estávamos em uma posição defensiva e não especulativa", reage o presidente Joaquim de Castro Neto. Já o Unibanco Asset Management, que cuida do dinheiro de clientes, não usou a mesma estratégia. "Nós acreditávamos que a desvalorização seria acompanhada por uma elevação dos juros muito maior. O que não aconteceu", admite o diretor Jorge Simino. O resultado é que investidores como o ex-piloto de aviões Michael Zieminski acreditaram na proteção contra a desvalorização através do fundo Hedge DI Premium e viram seus recursos renderem apenas 3,7% contra a desvalorização de 64% do real. "Eles garantiram que meu dinheiro estava protegido", acusa Zieminski.

 

No Banespa, servidor faz a diferença

O Banespa parece aquele gordinho em mutação do trio DDD da Embratel. Sob gestão federal desde 1994, o banco paulista ficou magérrimo. O lucro de R$ 2 bilhões de 1997 caiu para esquálidos R$ 158 milhões em 1998, os depósitos afinaram à metade em dois anos e o resultado de janeiro, ao contrário das outras instituições, deu prejuízo. O Banespa perdeu R$ 57 milhões porque se desfez de vários títulos da dívida externa justamente antes da desvalorização. Agora, uma nova ameaça pode torná-lo ainda mais raquítico, meses antes da privatização que deverá acontecer ainda neste semestre. Para forçar a União a rever a Lei Kandir, o governador paulista, Mário Covas, ameaçou transferir as contas do funcionalismo do Banespa para a Nossa Caixa. Mensalmente, o pagamento dos servidores movimenta cerca de R$ 850 milhões no caixa do banco. "A privatização está atrasada porque Covas resistiu em manter as contas", diz um técnico do Ministério da Fazenda. O governador já havia transferido a conta única do Estado – R$ 1,4 bilhão por mês – para a Nossa Caixa. "O funcionalismo vai ficar no Banespa, mas não está definido por quanto tempo", diz o secretário paulista da Fazenda, Yoshiaki Nakano. Na visão de banqueiros, esse é o filé. "O preço terá de ser menor", complementa o presidente do Citibank, Alcides Amaral. Mesmo sem as contas dos servidores estaduais, que somam 900 mil de um total de 3 milhões, existem boas razões para a compra do banco. "A base de clientes ainda é boa", diz o presidente do Bradesco, Márcio Cypriano. Além desses, os bancos Itaú, HSBC, BBV, BankBoston e Unibanco confirmaram a ISTOÉ sua intenção em participar da privatização. A experiência recente mostra que comprar um banco estatal é um excelente negócio. "O retorno do investimento é rápido", diz Alberto Matias, consultor da Austin Asis. Quem compra uma instituicão estadual ganha um crédito tributário sobre as operações financeiras feitas pelos maus pagadores e os passivos trabalhistas contraídos pela administração estatal. Na compra do Bemge no ano passado, o Itaú ganhou, por exemplo, cerca de R$ 300 milhões com esses créditos.

André Vieira e Wladimir Gramacho