A facilidade em aprender línguas acabou por definir a vida de Lilian Prist, 52 anos. Ser física nuclear era o seu sonho, mas aos 15 anos, durante uma viagem à Europa, notou que sem esforço assimilava outros idiomas. Aos 18 anos, falava inglês, espanhol, francês, italiano e escrevia em latim e hebraico. Lilian tinha um jeito próprio de aprender e passou a testá-lo com colegas de escola. Dava certo, mas era cedo para mudar alguma coisa. Lecionou nas melhores escolas de inglês de São Paulo e em 1980 criou um método próprio, no qual estimulava o uso da intuição, da imaginação e do prazer. Dez anos depois abriu uma escola. “Nunca me conformei com o sofrimento do aprendizado e a frustração que isso produz”, diz ela. De olho neste público cansado de tentar aprender e sem tempo ou vontade de voltar à escola, ela lançou em setembro o livro 7 trunfos para falar inglês (Editora DPL, 127 págs., R$ 18), que caminha para a terceira edição. Lilian prega que podemos aprender inglês se usarmos a parte do cérebro que nos liga à emoção, o que gerou interesse de travados de todo o Brasil e resultou no Reach 2000, um clube on line para quem quer aprender ou melhorar o seu inglês, divertindo-se.

ISTOÉ A sra. defende a utilização de uma parte diferente do cérebro?
Lilian – Sim, o lado mais intuitivo e instintivo. É assim que faz a criança e também o poliglota. O adulto se condiciona a usar o racional.

ISTOÉ No seu método, as cores são muito usadas. Os adultos não estranham?
Lilian – A cor tem a função de estimular a memória. O lado do cérebro que lê cor não é o mesmo que lê branco-e-preto.

ISTOÉ Quando falamos, utilizamos que parte do cérebro?
Lilian – A coisa é complexa. No livro, coloco de forma superficial para que a pessoa perceba que partes do cérebro desempenham funções diferentes. Temos uma área do cérebro – geralmente do la-do esquerdo – que é ligada ao racional.

ISTOÉ O método tradicional só estimula o racional?
Lilian – O sistema tradicional usa a lógica em primeiro lugar. O que proponho é que a utilizemos em segundo lugar. A aquisição da língua está ligada a significados. Se ficar discutindo verbo e pronome, o aprendizado fica na memória de curto prazo. Na memória de longo prazo vai o que tem história. É assim com a criança.

ISTOÉ Como refazer este processo natural que parece perdido quando queremos aprender outra língua?
Lilian – Se eu colocar uma fita didática de inglês para o meu neto de três anos, ele vai achar engraçado, vai repetir os sons, sem se preocupar em entender. O adulto não. A primeira função que ele aciona é a lógica. Há autocensura e medo de parecer burro.

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ISTOÉ É comum a crença de que saber como se escreve uma palavra facilita a memorização.
Lilian – Para aprender a falar, esse é o pior caminho. Em inglês, há várias palavras de escrita igual e sons diferentes. Veja os nomes Ronald Reagan (ex-presidente dos EUA) e Donald Reagan (que foi seu secretário do Tesouro), um se pronuncia reigan e o outro, rigan.

ISTOÉ A sra. diz que quando se fala em outra língua, a percepção do mundo e de si muda. O que quer dizer?
Lilian – Podemos notar isso no trabalho de atores. Quando você está falando uma outra língua é preciso vestir uma persona. Você tem que adotar o gestual, os trejeitos. Nessa novela da Globo (Terra nostra), eles não falam italiano, mas passam a certeza de que falam. Eles pegaram a musicalidade, o comportamento. Pense numa caricatura. Ela tem poucos traços reais da pessoa, mas você sabe quem é. É isso.

ISTOÉ A sra. também fala a respeito do instinto da linguagem. Como é isso?
Lilian – Steven Pinker, diretor do Centro de Neurociência Cognitiva do MIT (Instituto Tecnológico de Massachusetts), em seu livro O instinto da linguagem diz que o cérebro humano já vem programado para falar. É como se a gramática que estudamos na escola fosse o topo de um iceberg e embaixo estivesse uma estrutura comum. A percepção dessa estrutura vem conosco e, dependendo de onde nascemos, desenvolvemos a nossa língua. Essa capacidade, inerente a todos, é anulada pelos cursos que ensinam línguas como se ensinassem Matemática. Por isso, temos que ir ao instintivo, ao intuitivo.

ISTOÉ A sra. não acha que para o brasileiro é mais difícil, até pelas dimensões do nosso país?
Lilian – O brasileiro se sente na obrigação de saber inglês e é muito complexado. Há uma pressão violenta do mercado de trabalho. Com ansiedade, é difícil aprender qualquer coisa. Falar uma língua é desenvolver uma habilidade. Até a primeira língua foi adquirida por um processo, que exige um tempo para ouvir, para ouvir e repetir e depois falar bem. Não dá para pular estágios. Jovens que fazem intercâmbio relatam que não entendem nada durante os primeiros três meses e, um dia, destravam. Ele esteve assimilando, pegando o sentido no contexto, na expressão facial, nos trejeitos, usando outra parte do cérebro. Parece que é de repente, mas é um processo.

ISTOÉ Mas neste caso, os cursos de imersão não seriam uma boa saída?
Lilian – Se o curso for de 10, 12 horas por dia de aula tradicional não. Dá para aprender em casa, se divertindo com os amigos. Não é preciso pagar por isso. Com método, basta ligar sua tevê a cabo, ouvir vídeo, filmes e desenhos. Essa é a minha proposta para 2000. Que a pessoa utilize ferramentas à disposição. Quase todos têm vídeo e televisão a cabo.

ISTOÉ Isso exige grande disciplina.
Lilian – Não há dúvida. Os sete trunfos para falar inglês abrem caminho ao aprendizado. Os 11 exercícios propõem ver filmes sem legendas e observar o ambiente, as expressões. São sessões que você pode fazer sozinho ou em grupo, divertindo-se. Peço para desenhar, usar canetas coloridas.

ISTOÉ Como superar os entraves?
Lilian – Aí entra o orientador. É isso que proponho. Damos a mão, empurramos e acompanhamos a evolução. O ensino tem que se basear nas reações, nos obstáculos. As pessoas se preocupam em melhorar o vocabulário. Não sabem que bastam duas mil palavras para se virar muito bem em qualquer língua. Em inglês é ainda mais fácil. Em nosso coti-diano podemos contar pelo menos 500.

ISTOÉ O clube on line substitui a escola?
Lilian – O aprendizado formal não funciona com todos. O aluno adulto leva pelo menos 20 minutos para entrar no ritmo da aula, esquecer o trânsito, o trabalho. No clube on line, ele pode estudar sem sair de casa ou do escritório, e ainda ter um orientador que trabalha suas dificuldades reais. Se sintonizar o canal certo no cérebro, aprender inglês fica muito fácil. A dificuldade é um mito. Falar inglês não é só para eleitos.


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