Quando o artista espanhol Pablo Picasso (1881-1973) começou a se aventurar, em 1946, na produção de cerâmicas, já era um pintor consagrado. Talvez exatamente por esta razão não houve um único crítico de arte que à época ousasse se posicionar diante da surpreendente novidade. Na verdade, o conjunto de uma produção que soma quatro mil peças fala por si, revelando uma das fases mais radiantes do artista, aquela em que se casa com Françoise Gilot e vai viver no aprazível clima mediterrâneo do Sul da França. Desde a terça-feira 7, a Casa França Brasil, no centro do Rio de Janeiro, exibe a mostra Cerâmicas de Picasso, com 80 peças, nove linogravuras (cartazes de exposições assinados pelo mestre) e 27 fotografias de André Villers, que mostram Picasso em pleno ato de criação.

O curador da mostra é o neto Bernard Ruiz Picasso, que deve vir ao Brasil em janeiro para visitar a exposição. Quando seu avô morreu, ele tinha 13 anos e herdou a coleção de peças. Em entrevista por fax a ISTOÉ, Bernard Ruiz deixou claro que a cerâmica tinha a mesma importância para Picasso que a pintura ou a escultura. A diferença mais forte, no entanto, é que as figuras pesadas do período de guerra abriram espaço para uma produção leve e descompromissada do pós-guerra, marcada pela alegria e pela leveza. “O público só descobriu esta faceta de meu avô com as exposições na Royal Academy de Londres, em 1998, e no Metropolitan de Nova York, neste ano”, conta Bernard.

A mostra carioca exibe todas as maneiras com que o artista trabalhou. Há pintura sobre peças que já exis-tiam na olaria Madoura, próxima à cidade de Vallauris, outras com projeto encomendado ou criadas com exclusividade. Em cada uma delas, Picasso parece brincar de forma lúdica, até erótica, usando materiais diversos para produzir altos e baixos relevos. Entre seus temas prediletos estão a fauna e a mitologia. “A exposição permitirá ao público apreciar as cerâmicas através de uma cronologia”, explica Bernard. Tudo na obra de Picasso reflete sua total independência ao explorar o pensamento artístico, além de exercitar sua iconoclastia, observa a historiadora de arte Paula Terra. Outro aspecto interessante é que não há como controlar a cor de uma cerâmica, já que ela é submetida à alta temperatura. Para quem quiser se arriscar a comprar alguma das obras, os preços são bastante inferiores aos das pinturas ou esculturas, mas ainda assim alcançam os milhares de dólares. Beleza assinada custa caro.