Rogério Ceni é uma das figuras mais fascinantes da história do futebol. Muito mais do que ser um ótimo goleiro, ele se notabilizou justamente por fazer aquilo pelo qual é pago para evitar: gols.

Como goleiro-artilheiro, a carreira de Rogério é incontestável: marcou 110 gols na carreira, pelas contas do São Paulo Futebol Clube, e 108 pelas contas da Fifa. Não foi uma nem duas nem três vezes que ele salvou o seu time com um gol de falta, sua especialidade — foram várias. E o mais incrível é que em mais de 15 anos abandonando o gol para fazer o papel de atacante, Rogério Ceni só foi surpreendido uma vez, quando Roger, do Fluminense, chutou do meio de campo enquanto o goleiro ainda comemorava um gol de pênalti.

Aliás, Rogério só teve a liberdade de ser o batedor de faltas oficial do São Paulo por causa de sua excelente estatística — ou faz o gol ou chuta para fora, tendo tempo para voltar. Poucas vezes ele chutou na barreira e teve de voltar correndo para o gol abandonado. Em mais de 1.000 jogos, como um César do Morumbi, Rogério deu o pão e o circo para a torcida tricolor.

Rogério é tão diferente de outros jogadores que nem pode ser considerado um só. Existem dois Rogério Ceni: o que faz gols e o que cata no gol.

Este segundo Rogério, o goleiro convencional, nunca teve a mesma unanimidade da crítica e dos técnicos. Nenhum técnico que passou pela Seleção Brasileira deu o posto de titular numa sequência de partidas para o ídolo são-paulino. Taffarel, Marcos, Dida e Julio César sempre ofuscaram Rogério na seleção. Ceni é tão diferente que até o título mundial da Copa de 2002 não foi bem deglutida por ele — afinal, além de ser o terceiro goleiro, atrás de Marcos e Dida, só ele e Dida, dos 23 convocados de Felipão, não disputaram nenhum minuto de partida. Uma injustiça, da qual ele nunca reclamou, mas algumas vezes ele manifestou muito mais felicidade por ter conquistado o título mundial de clubes pelo São Paulo, em 2005, do que a honra de ter ganhado a Copa do Mundo pelo Brasil.

Para a torcida e a diretoria do São Paulo, Rogério Ceni é o maior goleiro do Brasil e ponto. Talvez seja o maior ídolo do time em todos os tempos, superando craques como Leônidas, Roberto Dias, Pedro Rocha e Raí. Ele manda e desmanda no Morumbi. Muitos o querem como presidente do clube. Do alto de sua centena de gols e da confiança de sua torcida, Rogério segue sendo titular do gol tricolor. Entretanto, depois de uma longa contusão no ombro e já aos 40 anos, seus reflexos não são mais os mesmos. As falhas têm sido frequentes. E alguns torcedores já postam nas redes sociais: “Sou são-paulino e Rogério Ceni não me representa”.

Diante das críticas, o goleiro-artilheiro rebate dizendo que continua sendo artilheiro. Mas, pela primeira vez em sua brilhante carreira, ele começa a ser julgado pelo que faz só como goleiro e não como artilheiro. Talvez ele tenha a humildade e a sabedoria de parar por cima (ainda dá tempo). Ou logo veremos um ex-jogador em atividade vivendo das glórias do passado.