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JIMBO
Voando leve nas perigosas esquerdas de Padang Padang

Ainda estritamente associado a adolescentes aloirados de corpos delgados e esbeltos, o surfe há muito não corresponde, ou pelo menos não se restringe, a esse puído estereótipo. Mesmo no Brasil, onde sua prática é algo relativamente recente, já começa a ser comum encontrar atletas com mais de 60 anos de idade na água, desfrutando da saúde e das propriedades de religação espiritual que o esporte/arte das pranchas oferece. É verdade que figuras como Thomas Rittscher, Osmar Gonçalves e Jua Haffers surfaram no Brasil bem antes disso, mas boa parte da geração que encarou as ondas no final dos anos 50 e início dos 60, considerada por muitos a primeira turma real do esporte no País, ainda continua ligada ao mar e às ondas. Da mesma forma, gente de todas as classes sociais, dos casebres da favela do Titanzinho no Ceará aos blindados escritórios do homem mais rico do Brasil (ver coluna edição 2250
em https://migre.me/dRpeA).

Mas muita gente imagina que fluir sobre as ondas seja algo proibido aos donos de corpos mais pesados e absolutamente vetado aos chamados obesos. James Scott Pellegrine, visto na foto ao lado encarando cheio de estilo uma das ondas mais técnicas e temidas do mundo, a esquerda de Padang Padang na Indonésia, resolveu ignorar esse tipo de crença e toda espécie de preconceito. Nascido no continente americano, seus pais se mudaram para o Havaí quando o pequeno (pelo menos à época) Jimbo tinha apenas uma semana de vida. O garoto cresceu no lado norte da ilha de Oahu e, desde moleque, nunca deixou que seu corpo pesado e sua genética “XXX Large” se tornassem um impedimento. Fez tudo que um moleque havaiano podia fazer. E isso inclui acidentes de carro, duas temporadas em centros de reabilitação para menores antes dos 18 e muitas, muitas ondas grandes e perfeitas. Morando em Bali, na Indonésia, há cerca de dez anos, Jimbo tem hoje 42 anos e algo entre 180 e 200 quilos. Tem uma empresa que representa algumas grandes marcas de equipamentos e roupas para surfe no arquipélago, além de trabalhar com locação de imóveis e curtir as intermináveis baladas balinesas. Faz bons negócios e continua surfando. Muito e bem. Mesmo já sendo quase um local por ali, diz que ainda sofre com preconceito e olhares incrédulos quando aparece remando com sua prancha nas águas verdes da Indonésia. “O mundo tá cheio de babacas. O que vou fazer se tem gente que prefere odiar? E, de qualquer jeito, eu surfo melhor do que a maioria deles”, diz, rindo, mas deixando escapar uma ponta de frustração quando fala do assunto. “Não entendo por que algumas pessoas se esforçam tanto para falar de como as outras deveriam ser e viver. Esse tipo de gente me deixa maluco. Tento me acalmar e apenas me esforçar para ser um cara melhor para mim e para as pessoas que realmente importam.” Assim Jimbo explica sua atitude numa entrevista recente à jornalista Milly Lacombe. E ajuda, com seu surfe preciso e sua maneira de levar a vida, a espantar mais esse estereótipo burro para longe do mar.

A coluna de Paulo Lima, fundador da editora Trip, é publicada quinzenalmente