Ao longo da sua trajetória de banqueiro, Lázaro de Mello Brandão revelou ser um senhor de gestos comedidos e frases curtas, mas sempre dono de decisões certeiras. Ao anunciar na quarta-feira 27 um lucro de R$ 1 bilhão, o maior já registrado pela iniciativa privada brasileira, Brandão voltou a mostrar sua astúcia ao esconder até os últimos instantes uma das decisões mais aguardadas do mercado financeiro: a sucessão no Bradesco, conglomerado com ativos de quase R$ 70 bilhões e participações acionárias em 34 grandes empresas. Depois de 18 anos à frente da diretoria-executiva, "seu Brandão", como é chamado pelos colegas de diretoria, anunciou sua saída do comando diário, passando o bastão, como reza a cultura do banco, a um executivo de carreira. Decidiu ainda mudar o estatuto para reforçar as funções do conselho de administração, em que permanece como presidente. O novo comandante das operações do dia-a-dia chama-se Márcio Cypriano, um executivo de 55 anos, que presidia o BCN, incorporado ao Bradesco no final de 1997. Numa tacada de mestre, o decano dos banqueiros brasileiros – escolhido pessoalmente pelo lendário Amador Aguiar, fundador da instituição nos anos 40 – acalmou as lutas internas pela sucessão e manteve seu poder. Aos 72 anos, ele não pensa de jeito nenhum em aposentadoria. "Vou me alongar até onde der", afirmou a ISTOÉ.

Ao fortalecer a cúpula do conselho de administração com três dos mais experientes banqueiros brasileiros – Antônio Bornia, Dorival Bianchi e Mário Teixeira Júnior, todos eles cardeais do Bradesco –, Brandão prepara a maior instituição financeira da América Latina para os desafios do futuro. "Como são os maiores, eles são hiperconservadores, mas inevitavelmente vão ter de se globalizar", afirma um ex-presidente do Banco Central. Nos últimos anos, vários bancos estrangeiros aterrissaram no Brasil, aumentando a competitividade do setor. Até abril, espera-se a venda do Banespa. Nos últimos anos, o Bradesco ampliou muito sua participação em grupos industriais e áreas de infra-estrutura, o que parece indicar o seu interesse fora do setor financeiro. Sua presença no Exterior é menor do que a de seu rival, o Itaú. São decisões como essas que cabem ao novo conselho, presidido por Brandão. "Qualquer investimento que ultrapasse 1% do patrimônio líquido (cerca de R$ 60 milhões) deve ser analisado pelos conselheiros", afirma Bornia, um dos novos membros do conselho.

Para chegar ao cargo que ocupa, a ginástica de Brandão se resume a uma jornada diária de 12 horas feita religiosamente, de segunda a sábado, desde 1942, quando entrou como escriturário na casa bancária Almeida & Cia., a instituição que precedeu o Bradesco. Todo o processo de sucessão foi mantido em sigilo. Ele próprio redigiu a carta de desligamento da diretoria e só sua esposa, dona Albertina, com quem está casado há 49 anos, sabia da decisão. O novo presidente-executivo só foi informado na noite anterior. Meses atrás, Cypriano teria recebido de Brandão uma indicação de que poderia assumir o comando, mas não imaginava que seu nome fosse confirmado. Os demais executivos só souberam da troca na reunião do conselho, horas antes do anúncio público. "Ficamos surpresos", afirmou Luiz Trabuco Cappi, promovido a vice-presidente. Amigo de Brandão há 40 anos, Antônio Beltran Martinez, que saiu do Bradesco para fundar o BBA, visitou-o dois dias antes. "Ele guardou tudo a sete-chaves", afirmou. "É uma pessoa muito reservada", declara Alcides Tápias, que chegou a ser um dos cotados a sucedê-lo e deixou o Bradesco para assumir o conselho de administração da construtora Camargo Corrêa em 1996. Como sempre, vingou o trabalho silencioso de Brandão.


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