Para passar férias no Clube Rincão, fazenda perto de Guaratinguetá, no interior de São Paulo, não é necessário levar malas. Nem bagagem, nem roupa, nem um simples maiô. Isso porque, lá, todo mundo anda pelado. Localizado em uma bela região montanhosa e cercado por colinas, vales e cachoeiras, o clube é o primeiro do Estado de São Paulo a fazer da nudez uma prerrogativa para frequentá-lo. "Não basta ficar pelado, tem que ter respeito. O lugar não está aberto para homens solteiros. Só aceitamos casais, grupo de amigos de ambos os sexos e famílias", esclarece outras regras o médico Alexandre Tsanaclis, 50 anos, proprietário do local.

Adepto do naturismo (nudismo em contato com a natureza) há mais de 20 anos, Tsanaclis resolveu equipar sua fazenda de 60 alqueires – que antes servia para a produção de leite – com restaurantes, piscina e chalés. "Queremos criar uma comunidade diferente", diz o médico, que compartilha com sua mulher, Ana Maria, o prazer em ficar pelado. "É um espaço para quem se incomoda com o uso compulsivo de roupas, com essa hipocrisia de vestir um biquíni, uma sunga", afirma Tsanaclis, presidente da Federação Brasileira de Naturismo, com três mil filiados.

Há cinco anos em funcionamento, o clube conta hoje com 100 famílias associadas. Prática comum no Exterior, ficar pelado no Brasil está deixando de ser atividade feita só à beira-mar. Além de praias como as famosas Tambaba (PB) e a do Pinho (SC), hoje há colônias naturistas na floresta amazônica, em Minas Gerais e no interior do Rio de Janeiro. Quase bucólica, a nudez campestre não é praticada apenas por quarentões despudorados. "Acho muito gostoso. O problema é passar o fim de semana aqui, ficar 48 horas sem roupas e na segunda-feira ter que ir trabalhar de saia, salto e meia-calça. Se pudesse, eu iria pelada", diz a auxiliar de administração Andréa Coleto, 20 anos, em sua segunda visita ao Rincão. Embora o clima do lugar seja totalmente "família", o clube de nudismo tem suas peculiaridades. "Futebol não dá para jogar", ri o estudante Márcio Nunes, 17 anos. "E a paquera, quando rola, é diferente. Não tem aquela paranóia da gostosa ou do musculoso, as pessoas se atraem pela conversa pois o resto já foi visto", completa. "Nuas, as pessoas estão sem cascas, livres de julgamentos e preconceitos. Aqui todos são iguais", exalta Maria Tereza Pereira, 24 anos, supervisora do Rincão. Há imprevistos, como ocorreu com a própria Maria Tereza durante um banho de cachoeira. Por descuido, a moça esbarrou numa casa de marimbondo e se viu perseguida por um enxame. Mais exposta às ferroadas, ela saiu em disparada e gritou assustada para os demais naturistas: "Gente, pula na água!"

Deixar tudo à mostra é para muitos uma experiência inesquecível. "Estou me sentindo meio Adão depois de comer o fruto", brinca o massagista Camilo Flamarion, 56 anos, nudista de primeira viagem. Sem lenço nem documento, o taxista Belarmino Barbosa, 47, estava exultante: "Realizei um sonho de forma inesperada. Vou voltar e trazer a patroa comigo."

 

Todo mundo nu

Há dez anos, existia apenas uma área naturista oficial no Brasil: a praia do Pinho, em Santa Catarina. Hoje, há mais de 20 lugares onde é possível ficar nu ao ar livre e em contato com a natureza. "Isso reflete uma mudança desta década, quando o naturista deixou de ser visto como uma ameaça ao pudor e teve sua atividade regulamentada", afirma Celso Rossi, diretor da Naturis, publicação bimestral sobre o segmento, e um dos proprietários da Colina do Sol, área naturista no Rio Grande do Sul. De acordo com Rossi, o naturismo no Brasil é mais praticado nas regiões Sul e Sudeste em função da colonização européia. "A aceitação de hábitos europeus aqui é mais natural."

O naturismo é praticado na Europa desde o começo do século e conta hoje, em países como a Alemanha, com cerca de 16 milhões de adeptos. Lá fora o turista tem diversas opções para exercê-lo: pode viajar em um cruzeiro marítimo, escalar montanhas nevadas e até praticar mergulho com tubarões. No Brasil, embora o número de áreas tenha se multiplicado, esse turismo ainda está engatinhando. "Apesar de ter enorme potencial, é um setor embrionário em termos de infra-estrutura", avalia Wilson Carlotti, diretor da Natur, uma das poucas agências a operar em áreas naturistas no País e no Exterior. Há quatro anos neste mercado, ele afirma que os brasileiros ainda preferem viajar para fora do que desbravar o território nacional. "O naturista se importa muito com seu conforto e aqui as atrações ainda são o sol e o mar."