Eles cansaram. Carlos Jereissati, de ver seu nome envolvido inclusive na história do grampo do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Os sócios capitalistas, de ver seu negócio tão desgastado na mídia. Resultado: Jereissati, mais a Macal Investimentos, dos empresários Jorge Paulo Lemann, Carlos Alberto Sicupira e Antônio Dias Leite Neto, estão deixando o polêmico consórcio Telemar, dono da Tele-Norte-Leste. O bolo dos dissidentes será dividido. Dois atuais sócios na Telemar, o grupo Inepar e a construtora Andrade Gutierrez, ficarão com uma parte. A outra está sendo passada ao Bradesco e à Telecom Italia. O encarregado de negociar com os italianos, e que rumou à Europa para tratar diretamente do assunto, foi o presidente da Inepar, Atilano de Oms Sobrinho – que desponta cada vez mais como o líder do consórcio, instalado no quarto andar do prédio da Telerj, na zona sul do Rio. Jereissati manda negar a história da venda ao Bradesco, mas a Telecom Italia, acostumada a repetir apenas que se interessa muito pela telefonia brasileira, admite que está discutindo a compra, embora explique que não possa dar mais detalhes agora.

A saga da Telemar, que arrematou, durante o leilão da Telebrás, a Telerj e outras 15 telefônicas fixas, sempre foi marcada por episódios confusos. Por exemplo: a empresa de Jereissati, a La Fonte, não se pré-qualificou para o leilão, por isso não pôde participar diretamente do consórcio. Só conseguiu seu quinhão por meio de uma verdadeira engenharia jurídica que lhe rendeu ações de um condomínio formado pela Telemar. Mas Jereissati, o amigo dos antigos administradores de fundos de pensão, assumiu a liderança do negócio e a presidência do conselho de administração do grupo controlador da Tele-Norte-Leste. Acabou batendo de frente com todos os outros sócios, principalmente Sérgio Andrade, dono da Andrade Gutierrez, insatisfeito com os constantes bombardeios. A primeira bomba foi atirada pelo BNDES. Acionado pelo ex-ministro Luiz Carlos Mendonça de Barros, que preferia ver o Opportunity na Norte-Leste, o banco acusou a Telemar de não ter uma empresa operadora como sócia e de não ter dinheiro para honrar o pagamento. O BNDES, então, entrou no consórcio como "salva-vidas". Estava tudo certo para um rearranjo societário, que agora melou. A La Fonte, a Inepar e a AG Telecom, empresa de telecomunicações da Andrade Gutierrez, ficariam com 11,25% cada. As seguradoras Brasil Veículos e Aliança do Brasil, administradas pelo Banco do Brasil, teriam juntas 10,1%, e os fundos de pensão, com 19,9%, dando espaço aos 25% do BNDES. Mas outra grande bomba explodiu quando a Telemar foi citada nas fitas do grampo, apelidada por Mendonça de Barros de "telegangue".

Há quem acredite que a mudança tem uma certa sincronia com o leilão das empresas-espelho. A concessão para explorar a mesma área da Tele-Norte-Leste foi vendida no último dia 15 para o Consórcio Canbrá, liderado pela operadora Bell Canada e pela americana Qualcomm. A Telecom Italia seria mais uma força para combater a nova e forte concorrente, embora os executivos da Telemar, muitos deles ex-funcionários de carreira da Telebrás, estejam fazendo um trabalho reconhecido pelo mercado. O analista de telecomunicações do banco BBA, Carlos Constantini, diz que a Tele-Norte-Leste conseguiu unir suas 16 subsidiárias e criar escala para negociar melhor os preços com os fornecedores. "A redução em relação aos preços anteriores é de 30%, 40%", explica.

O circo está armado, mas falta um passo indispensável: para fazer qualquer mudança, os consórcios precisam de aprovação da Agência Nacional de Telecomunicações, a Anatel, que baseia suas decisões na Lei Geral de Telecomunicações. Pelas regras atuais, os integrantes da Telemar não podem vender e a Telecom Italia não pode comprar, porque já arrematou no leilão outra companhia telefônica fixa, a Tele-Centro-Sul. "A lei é muito clara: os integrantes de um consórcio têm de ficar no grupo por cinco anos e não podem vender sua parte. A idéia de dividir a Telebrás e vendê-la em blocos era criar competição. Se a Anatel permitir certas trocas, estará permitindo especulação com o patrimônio", avalia o advogado especializado em telecomunicação Walter Ceneviva. A Anatel diz que só poderá se posicionar quando houver um pedido formal, e que nada será feito à revelia do órgão. O problema é a demora disso tudo. A própria Tele-Norte-Leste fez uma consulta sobre mudança acionária logo depois do leilão, em agosto, mas somente em dezembro a Anatel enviou o pedido apreciado e aprovado ao Conselho de Administração de Direito Econômico, o Cade. Incomodada com as críticas, a Anatel garante que está preparando um novo regulamento para as questões de transferência de participação, após aceitar sugestões via consulta pública na Internet.

Além de driblar a Anatel, a Telemar precisa do aval da BR Telecom, uma sociedade entre a carioca Riolistas e a ODA, subsidiária da France Telecom. A Telemar e a BR Telecom entraram separadamente na disputa pela Tele-Norte-Leste, mas assinaram um contrato de parceria, pelo qual o vencedor deve dividir suas ações com o outro. O diretor da BR Telecom, James Tompkins, que mantém conversações com a Telemar para que o contrato seja cumprido, informa que precisa aprovar qualquer mudança no consórcio. "Até agora, nada nos foi comunicado." Também pudera, transparência jamais foi o forte deste empreendimento.

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