Nos condomínios que povoam a costa brasileira entre Angra dos Reis e Paraty, no Rio de Janeiro, a população já se habituou à revoada de helicópteros e aviões no final das tardes de domingo. Sob o céu das enseadas da Mombaça, Portogalo, Frade e Laranjeiras, onde a crise raramente ultrapassa a portaria, descansam brasileiros de costumes muito particulares: eles evitam frequentar a praia nos fins de semana e feriados, quando indesejáveis saveiros, lotados de curiosos, se aproximam inquisidoramente de seus domínios. As casas e lanchas cinematográficas que sediam o mais glamouroso verão do Brasil são atrações irresistíveis. Mas seus proprietários odeiam platéia.

Em Mombaça, a mais bela e exclusiva propriedade é a de Roberto Marinho, dono das Organizações Globo. Fica em uma praia privada, compartilhada apenas com seu filho, João Roberto. É um exemplo de elegância e conforto sem ostentação, griffe do decorador carioca Hélio Fraga Júnior. A não ser pelos tapetes orientais, as telas de Manabu Mabe, de Heitor dos Prazeres, de Aguilar, de Meziat e de Aldo Bonadei, e por um elevador entre os dois pavimentos. Das 13 suítes de hóspedes, sete dão para o mar e para o jardim de inverno. A sala de tevê, a ampla copa e a cozinha têm ar-refrigerado central.

Ao lado da residência amarela, os flamingos (presente de Fidel Castro) dividem um pequeno lago com patos coloridos, à sombra de uma mangueira repleta de bromélias. Uma escultura de bronze, assinada pelo próprio Roberto Marinho, compõe o ambiente. Isso sem falar no viveiro de peixes, menina dos olhos do dono da casa. O casal contempla toda essa maravilha de quartos separados, no segundo piso, onde ficam outras cinco suítes. Só a de Roberto Marinho possui computador. "Ele precisa se ligar todo o tempo", observa o simpático administrador Eugênio Marques, há 20 anos na casa. Os armários mantêm poucas peças de roupas apropriadas a uma casa de praia, além de roupões de seda.

 

Helicóptero para dez A casa costuma viver cheia de convidados, mas o próprio Roberto Marinho a frequenta pouco. Só vai lá com tempo firme, que garanta deslocamento seguro ao helicóptero Dofan, com capacidade para dez passageiros. O prato mais pedido à cozinheira Dalva, filha de Eugênio, são camarões e peixes grelhados. Domingo é dia de feijoada light, com carnes de porco magras. De sobremesa, sorvete de macadâmia Häagen Dasz ou pudim de café. Não pode faltar vinho branco Chateau Pouilly, ou o tinto Haut Brion, 88. Quando eles recebem convidados vips, convocam o chef Laurent Suaudeau, de São Paulo.

A idade avançada dos proprietários não impede os passeios de barco. O que eles mais gostam é sair no Tamarind I, um iate de 105 pés, verdadeiro palacete flutuante. Costumam navegar até a Ilha Grande, onde passam o dia inteiro. O iate foi construído na Inglaterra e há dois anos passou por uma reforma. Todo o madeiramento foi trocado por peroba do campo maciça. A sala e as três suítes têm ar-refrigerado central. O iate reúne cinco Di Cavalcanti, um Burle Marx e dois Portinari – um painel e uma pequena tela de 1942, avaliada em R$ 80 mil. Quem se entediar com a paisagem, pode distrair-se com uma televisão de 29 polegadas ou com música na melhor tecnologia de som. "Esse sistema de navegação é o mais moderno do mercado", comemora o marinheiro Henrique Pinto, um dos cinco da casa, servida ainda por quatro jardineiros, copeira, cozinheira, garçom e duas arrumadeiras.

Angra tem um aeroporto movimentado. Nos fins de semana, são 50 pousos de jatos fretados por dia. O número de aparelhos privados, no entanto, é bem menor do que em Paraty. O comandante José Afonso, dono da Líder, por exemplo, tira bom proveito dos dois jatos Citation e Lear jet, de sua empresa. "Não é questão de inveja, mas a gente se sente pequeno", admite o caseiro José Francisco, 37 anos, que trabalha no Condomínio Mombaça.

O padrão no condomínio Laranjeiras, maior aglomerado de milionários da costa brasileira, não é diferente. O empresário Carlos Alberto Filgueiras, dono de uma rede de motéis, por exemplo, se desloca para o aeroporto de Paraty a bordo de sua Toyota preta, uma Line 2.8 D. Entra em seu avião particular, um King 90, de US$ 2,5 milhões, e embarca para São Paulo depois de um relaxante fim de semana. Quando o empresário Antônio Ermírio de Moraes, do Grupo Votorantim, sai da capital paulista para visitar seu irmão José Ermírio no mesmo condomínio, também opta pelo vôo sobre paisagens paradisíacas a bordo do helicóptero da família.

 

Segurança implacável A turma do Laranjeiras isola-se do mundo protegida por um pequeno exército de seguranças e por duas rigorosas guaritas que jamais deixam passar um curioso. Lá dentro, a mentalidade mudou. Luxo hoje, para essas pessoas, é muito mais conforto do que exibição de baixelas. As 140 casas do condomínio têm ar-condicionado central e o clube oferece restaurante, quadras de tênis e campo de golfe. Mas vale lembrar que até nesse ambiente, onde todos parecem ser igualmente milionários, convivem diferentes castas – a dos emergentes, como os Filgueiras, e a dos tradicionais, como os Ermírio de Moraes, os Setúbal e os Bueno Vidigal. Os empregados, ex-pescadores e seus descendentes, que foram gentilmente removidos da beira da praia em troca de lotes no interior e de empregos domésticos, moram na vila vizinha. Um deles desabafa: "As casas são um exagero, dá para se revoltar." Mas na hora de receber o salário em torno de R$ 500, conforma-se. Na vila de empregados, em modestas residências também proliferam carros, nacionais, é claro, além de aparelhos de tevê e microondas.

Já as casas do Laranjeiras nada têm de modestas. A de José Ermírio, por exemplo, é coberta por telhas de porcelana branca. A piscina é interna, de forma que o telhado de vidro protege os usuários dos raios ultravioleta do sol. No inverno, a água é aquecida e à noite deixa ver as estrelas. A magnífica decoração é de Sig Bergamin. Até o material usado na construção é especial. As paredes da casa de Marcos Ometo, dono do Açúcar da Barra, por exemplo, são revestidas com pó de isopor, de aplicação trabalhosa, mas excelente isolante térmico e sonoro. Melhor, impossível. O preço de imóveis no local vai de R$ 200 mil a R$ 5 milhões. O condomínio mensal é de R$ 1,7 mil. Garante, entre outras maravilhas, uma moderníssima estação de tratamento que transforma o esgoto em água potável. Os aluguéis são cotados em dólares e as diárias nessa época oscilam de US$ 1 mil a US$ 2,5 mil.

Sangue azul Em Paraty, o encanto se ancora mais nos livros de história do que nos livros-caixa. No caso de d. João de Orleans e Bragança, 82 anos, morador antigo do centro histórico da cidade, a fortuna anda meio esgarçada, mas, o sangue é azul. O bisneto de d. Pedro II e neto da princesa Isabel dá mais valor à elegância do que à ostentação. Acorda às 7 horas e pinta por toda a manhã. Depois do almoço, faz uma sesta. À noite a cozinheira é dispensada e ele visita, a pé, os restaurantes da cidade. Sua mulher, Teresa, ex-Souza Campos, fez do casarão de mais de 300 anos um local de exemplar bom gosto e aconchego. O ar de nobreza fica por conta dos retratos de ancestrais e dos objetos de uso pessoal dos imperadores. Há charme maior?

A casa fica animada nos finais de semana. O casal adora receber na maior simplicidade. Acomodados numa bancada, os vips são contemplados com uma caldeirada. "É um salve-se quem puder", brinca o príncipe, com seu sotaque francês. Embora criado em um castelo na França, não viveu ostentando. Quando vê o estilo dos vizinhos milionários, confessa que não sente inveja. "Eles vivem ameaçados em fortalezas", descreve.

Por conta desse medo, o proprietário de uma das mais belas residências de Paraty, um tabelião carioca, concorda em expor o que os muros de todo um quarteirão escondem, desde que seu nome seja omitido. O interior é um verdadeiro museu de quadros, tapetes, móveis antigos, prataria e porcelanas. Na sala de jantar, com mesa de 12 lugares, um magnífico tapete francês Aubusson toma toda uma parede. Esculturas de cerâmica de Santo Antonio do Porto, na piscina, acentuam a atmosfera colonial lusa da arquitetura do local. "Somos apaixonados por Paraty", exulta a proprietária. No glamouroso verão dos endinheirados, o charme não está na praia e as melhores atrações dispensam a obrigação de pisar na areia e entrar no mar.