Nas férias de verão, principalmente se o sol aparece, nada melhor do que ir para uma casa na praia, andar pela areia, tomar banhos de mar. E nada pior para estragar esse prazer do que pisar num ouriço, encostar numa água-viva ou sentir uma coceira insuportável e ficar com o corpo repleto de feridas causadas pelos borrachudos, na verdade, pela fêmea que precisa de sangue para se reproduzir. Típicos do cenário praiano, esses acidentes aumentam com a invasão, pelos turistas, dos cerca de oito mil quilômetros de costa marinha brasileira. Neste ano, uma das vítimas dessas armadilhas da praia foi a estudante Renata de Toledo Rudge, 21 anos. Às vésperas do réveillon em Pouso do Cajaíba, no Rio de Janeiro, ela foi picada por um inseto no olho esquerdo e desenvolveu um forte processo alérgico. "Meu rosto ficou deformado, o olho estava tão inchado que não conseguia nem enxergar. Além disso, pintas vermelhas começaram a se espalhar até o couro cabeludo. Ardia e coçava muito", conta Renata, que depois de 13 dias da picada do inseto continua fazendo tratamento com remédios antialérgicos, já em sua casa em São Paulo. Mais aliviada, hoje ela consegue rir dessas lembranças, inclusive da foto que tirou ao lado dos amigos para registrar os estragos do borrachudo em seu olho.

No entanto, as lembranças nem sempre são engraçadas. Das férias de fim de ano na Bahia, o dono de butiques de pães e padeiro Olivier Anquier, 38 anos, guarda um susto e tanto. Ele estava em Porto Seguro quando foi picado por um inseto na cintura. Na volta para São Paulo, a picada o incomodava de tal forma que ele não parava de coçá-la. As unhas acabaram infeccionando a ferida e por pouco Anquier não sofreu uma infecção generalizada. "Cheguei a 40 graus de febre e tive sorte porque corri para o hospital", conta. O saldo da picada foram dez dias de internação, completados na semana passada, no Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo, com tratamento à base de antibióticos. Nem sempre tão graves, os acidentes são mais comuns do que se imagina. Num levantamento de dados para sua tese de mestrado, o dermatologista Vidal Haddad Junior, da Universidade Estadual Paulista, constatou que só no pronto-socorro da Santa Casa de Ubatuba, litoral norte de São Paulo, por exemplo, de cada mil pacientes atendidos, um relatava problemas com animais marinhos venenosos. "Acredito que esse índice ainda é maior porque muita gente não procura ajuda no hospital", diz Haddad.

A pesquisa durou 18 meses e apontou também o maior culpado por esses acidentes. Segundo o trabalho, o ouriço com seus espinhos é o principal corta prazer dos banhistas, responsável pela metade dos 144 pacientes atendidos. A água-viva, espécie venenosa que provoca dolorosas queimaduras em quem cruzar seu caminho, foi a segunda classificada no ranking de periculosidade, atingindo dois de cada dez dos pacientes estudados. E dos seis tipos de águas-vivas existentes no litoral do Brasil, a caravela é a que tem o veneno mais forte, e, por isso, a mais temida. De fato, quando se lembra de dias desastrosos na praia, as águas-vivas quase sempre surgem como as vilãs. Há duas semanas, aliás, os cariocas tiveram que repartir com elas o mar. Imagina-se que os animais tenham chegado ao litoral carioca trazidos por correntes provenientes de Arraial do Cabo, na região dos Lagos, onde, não se sabe bem por que, sua população é grande. Há ainda outras razões para essa multiplicação. "A água mais fria e escura do verão no Rio favorece a procriação desses animais", explica Marcos Bastos, professor do Departamento de Oceanografia da Universidade Estadual do Rio de Janeiro. Um dos resultados desse processo da natureza foi um grande número de gente queimada pelas águas-vivas nas primeiras semanas de janeiro. A estudante carioca Sara de Almeida, 13 anos, por exemplo, foi atingida por uma delas no braço esquerdo quando tentava se refrescar do calor de 34 graus que fazia no Rio na terça-feira 12 nas águas da praia de Copacabana. Seguindo os conselhos da amiga, ela passou gelo na região queimada. "Uma vez furei o pé na areia. Inchou e coçou muito. Pelo jeito vou ter que ficar mais atenta quando vier à praia", lamenta Sara.

Tão comum quanto borrachudos e águas-vivas são os bichos geográficos. Larva expelida pelas fezes de cães e gatos, ela fica na areia e pode infectar o homem num simples passeio descalço. "Meu pé inchou e sentia muita coceira. É horrível. Mal conseguia encostar o pé no chão", lembra a professora Andréia Marcondes, 25 anos. Ela se contaminou no final do ano em Mongaguá, litoral Sul de São Paulo. Na verdade, quando se vai à praia, sabe-se que esses e outros bichos estão incluídos no pacote, mas é possível evitá-los ou pelo menos tratar seus estragos. Afinal, a praia é a casa deles. "As pessoas têm de estar conscientes de que estão no ambiente desses animais", afirma Álvaro Migotto, biólogo do Centro de Biologia Marinha da Universidade de São Paulo.

Colaborou Sidney Garambone (RJ)

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