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Jogar a próxima Copa do Mundo em casa, ao lado de sua torcida, pode favorecer o Brasil? Não. E explico o porquê. O futebol brasileiro tem quatro tipos de torcedores:
1) os que assistem os jogos na frente da tv;
2) os que vão ao estádio torcer, vibrar, zicar;
3) os famigerados uniformizados;
4) os que só aparecem nas Copas.

Desses, os únicos que realmente fazem diferença no estádio estão no tipo 3. Os tipo 1 servem para fazer aquela “corrente pra frente”, mas não interferem no resultado do jogo. Os tipo 4 produzem lindas fotos e interessantes closes na tv com suas caras pintadas nas cores de seu país. Ah, sim, a parte feminina do tipo 4 também produz gritinhos histéricos quando um Messi, um Cristiano Ronaldo ou um Forlan ameaçam marcar contra “nossa” seleção. Quanto ao tipo 2 — que costuma ir aos estádios e também estará nos jogos de 2014 –, sua relação com o time é mais de cobrança do que de apoio. Xinga, vaia, quer futebol-arte durante 90 minutos.

O máximo que os tipos 2 e 4 conseguem, nesse quesito, é a chatíssima música “eu sou brasileiro, com muito orgulho, com muito amor”, como se aquela história de pátria em chuteiras, que tanto inspirava as crônicas de Nelson Rodrigues, ainda existisse no mundo do futebol. Quanto aos torcedores do tipo 3, não estarão nos estádios da Copa de 2014 — pelo menos não reunidos, como costumam estar quando seus times jogam. E são eles, com suas músicas criativas, seu amor incondicional ao time, sua missão de ser o 12º jogador, que fazem a diferença. Junto com suas alegorias, entretanto, os tipo 3 trazem uma violência não rara dentro e fora dos estádios. Por isso, enquanto não se tornarem civilizados e colocarem toda sua energia apenas para embelezar o espetáculo, é bom mesmo que fiquem longe dos estádios. E ficarão.

Mas arrisco dizer que o Brasil perdeu a Copa de 1950 para o Uruguai, dentro de um Maracanã superlotado com 200.000 pessoas, porque todos os torcedores daquele 16 de julho eram dos tipos 2 ou 4. Jamais os torcedores do tipo 3 ficariam mudos diante do
2 – 1 uruguaio tendo ainda tempo suficiente para ir buscar o empate e o título. Na semifinal contra a Espanha (6 – 1 para o Brasil), o Maracanã cantava “Eeeeeu fui às touradas em Madri, parara-timbum-bumbum, parara-timbum-bumbum”, mas era só o embalo da chuva de gols.

A história vai se repetir?

Hegel diria que sim. Marx diria que sim também, mas dessa vez como farsa. A tragédia, na lógica marxista, foi a final de 1950. A farsa seria o favoritismo da Seleção Brasileira por jogar em casa, ao lado de sua torcida, no território do país do futebol — que em 2014 irá se transformar numa arena continental só para os brazucas trazerem a sexta taça e blá-blá-blá. A vantagem brasileira de jogar em casa só acontecerá se baixar o espírito bom (sim, ele existe) dos tipo 3 de um Internacional, um São Paulo, um Corinthians ou um Flamengo nos tipo 2, porque daí os tipo 4 vêm atrás.

Já pensou um torcedor colorado cantando “Brasil, estaremos contigo / Tu és minha paixão / Não importa o que digam / Sempre levarei comigo / Minha camisa amarela…”, um torcedor são-paulino gritando “Vamos Brasil,Vamos Brasil / Vamos ser campeão / Vamos lá, vamos lá , vamos lá / Vamos de coração!”, quiçá um flamenguista entoando “O Maraca é nosso / Vai começar a festa! / Dá-lhe, Dá-lhe, Dá-lhe, Eô / Brasil do meu coração” ou um corintiano cantando “Aqui tem um bando de loucos / Loucos por ti Brasil / Eu canto até ficar rouco / Eu canto pra te empurrar / Vamos, vamos meu Brasil / Vamos meu Brasil / Não para de lutar”.

Aí, sim, a torcida faria diferença. Só assim. Porque lá dentro de campo o que vale é o futebol jogado — e isso argentinos, espanhóis, alemães, italianos, franceses, uruguaios e ingleses também sabem fazer. Com muito orgulho, com muito amor.

Obs.: este blog será atualizado semanalmente, toda segunda-feira, ou mais vezes se algum tema do futebol justificar.