É possível que Luiz Inácio Lula da Silva não tivesse ideias tão claras quanto aos efeitos do Plano Real quando ele foi lançado ainda nos idos dos anos 1990. Como também é razoável supor que Fernando Henrique Cardoso não tenha, num primeiro momento, conseguido vislumbrar o impacto positivo do Bolsa Família no resgate das classes menos favorecidas para o mercado de consumo. O fato é que essas como outras inúmeras realizações nos mandatos de seus respectivos governos foram fundamentais para a consagração do longo período de estabilidade experimentado no País nos últimos 18 anos. Isso posto, é de surpreender que os dois ex-presidentes venham se empenhando em denegrir – ou, no mínimo, macular – a herança um do outro como tática eleitoral para 2014. A retórica de FHC e de Lula é, por assim dizer, equivocada. Dispõe da imponência e da solidez dos discursos para animar a turba, mas peca na essência dos argumentos. Fernando Henrique, cujo timbre agudo de voz bem o qualifica à condição de professor das densas lições, tratou na semana passada de reclamar de Dilma. Falou em ingratidão. Disse que a titular do Planalto “cospe no prato que comeu” e que a turma de Lula falhou nas grandes metas – o socialismo e a ética. Lula por sua vez buscou enriquecer a coreografia de suas recentes aparições públicas com uma profusão garbosa de autoelogios e peitos estufados. Comparou-se ao ex-presidente dos EUA Abraham Lincoln, dada a quantidade de críticas que ambos receberam. Falou em inveja do sucesso que ele e Dilma construíram, e ainda ironizou o adversário: “Acho que o Fernando Henrique deveria no mínimo ficar quieto… cada um fala o que quer e responde pelo que fala.” Definitivamente, tanto no campo administrativo como no político e no de ideias, FHC não é Lula e vice-versa. Mas cada um ao seu tempo deveria abrir espaço para um debate mais construtivo e realista. Essa velha rinha sobre quem é o melhor, discutindo ações passadas, parece um jogo de soma zero. Não há mais espaço no Brasil para invencionices, muito menos para que a cortina da herança política encubra a real necessidade da Nação em encontrar novos horizontes.