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PARA POUCOS
Sol, DJs e champanhe para a juventude dourada do Rio

Em 5 de julho de 1922, foi deflagrado o primeiro movimento militar armado que ficou conhecido como A Revolta do Forte de Copacabana, ou A Revolta dos 18 do Forte (em referência ao número de rebeldes), com o objetivo de derrubar as elites conservadoras do poder. Quase um século depois, esse mesmo Forte, que ocupa um paradisíaco pedaço de praia entre o Arpoador, em Ipanema, e Copacabana, ambos na zona sul do Rio de Janeiro, está sendo investigado pelos ministérios públicos Federal e Militar por permitir a privatização de sua praia também pela elite. Eles verificam se o Aqueloo Beach Club, um espaço VIP montado dentro da área de segurança militar, alugado por R$ 228 mil por três meses do Exército, estaria contrariando os preceitos legais que garantem que as praias brasileiras são bens públicos e não podem ser de uso exclusivo de ninguém.

O Comando Militar do Leste (CML) diz ter alugado a faixa de areia com base no decreto presidencial 3.725/2001, que permite ceder temporariamente bens da União. Porém, o mesmo instrumento legal veda a operação “se impedir o livre e franco acesso às praias e às águas públicas”. É exatamente o que está ocorrendo na praia do Forte. O lugar foi tomado por quem se dispõe a pagar até R$ 250 para se divertir num domingo ao som dos DJs da moda, brindar com espumante e relaxar com massagista e cabeleireiro. O advogado Luiz Paulo Viveiros de Castro, especialista em direito administrativo, explica que a cessão temporária de bens públicos não exige uma licitação propriamente dita, com edital e todo o longo processo de concorrência. Entretanto, esses aluguéis não deixam de ter suas exigências e até os valores cobrados devem seguir parâmetros estabelecidos pela Secretaria de Patrimônio da União (SPU). “O Exército sempre limitou o acesso à praia por ser uma área de segurança, mas ao liberar para o Aqueloo, caiu numa contradição”, diz o advogado. “Se o clube pode funcionar, é sinal de que a função militar já não é tão importante. Ou continua fechado ou libera para todo mundo.”

Depois de receber denúncias de moradores sobre o alto som da música eletrônica, o procurador federal Maurício Ribeiro Manso começou a investigar o caso. A promotora militar Maria de Lourdes Sanson também cobrou explicações do comando do Forte e do Exército, mas ainda não obteve resposta. Moradora de um prédio vizinho, a museóloga Vera Tostes vem fechando as janelas do apartamento nos fins de semana. “Não é uma música melódica. É uma batida repetida e irritante”, afirma.

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A praia do Forte não é a única de áreas militares do Rio que há décadas perderam o sentido de defesa. O Forte de São João, na Urca, também na zona sul, tem uma belíssima faixa de areia junto ao Pão de Açúcar, onde só civis indicados por militares, e que pagam anuidade de R$ 300, entram. Na Restinga da Marambaia, na zona Oeste, local de férias para presidentes da República, pessoas selecionadas também podem desfrutar das suas limpíssimas águas, a uma taxa de R$ 150 por trimestre. O antropólogo Roberto da Matta ressalta que, ao contrário de outros países, o Brasil sempre se orgulhou de ter suas praias públicas, mas o uso militar ou até por condomínios ainda é um problema. “Se formos questionar por que estão pagando para frequentar uma praia sem tumulto e arrastões, teremos que rever também o caso de presidentes que descansam nessas fortalezas ou de casas particulares que fecham o acesso ao mar”, provoca Da Matta. O assessor especial do Clube Militar, general Clóvis Bandeira, defende o “acesso controlado” em unidades utilizadas para treinamento do Exército.

No que depender do empresário responsável pelo clube, Daniel Barcinski, o Aqueloo será repetido no próximo verão. “Trata-se de um empreendimento bem-sucedido e nos moldes de outros projetos de sucesso do gênero, que acontecem em outros lugares, com Ibiza (Espanha), Saint Tropez (França) e Florianópolis (SC)”, argumenta.