01/03/2013 - 21:00
NA ESTRADA AMARELA
Oscar Diggs (James Franco), antes de se tornar o Mágico de Oz,
e uma das figuras fantásticas que encontra: universo onírico
A aventura da garota Dorothy, que foi levada por um tornado até a Terra de Oz e lá fez amizade com um espantalho sem cérebro, um leão covarde e um homem de lata que deseja ter um coração, é normalmente classificada como uma fábula infantil. Não são poucos, no entanto, os estudiosos que nela veem uma complexa alegoria à situação política e econômica dos EUA, no início do século passado. Seu enredo povoado de bruxas e cenários fantásticos como a Cidade de Esmeralda e a Estrada de Tijolos Amarelos, descrita inclusive por Elton John em uma de suas canções, rendeu 14 livros, todos escritos por L. Frank Baum (1856-1919). Nenhum deles, contudo, tratou diretamente do personagem Mágico de Oz, que dá nome ao volume inicial da série, adaptada posteriormente para um musical e para o clássico longa-metragem de 1939. Agora uma superprodução de US$ 200 milhões centra-se basicamente no passado do ilusionista Oscar Diggs (James Franco) e como ele tomou o poder nesse reino imaginário. “Oz – Mágico e Poderoso” (em cartaz na sexta-feira 8) mostra-o numa época imprecisa, que locais e figurinos sugerem ser o século XIX. Lépido e sedutor entre as atrações de um circo mambembe do Kansas, no interior dos EUA, ele ambiciona ser um misto do mago Harry Houdini e do inventor Thomas Edison.
VISUAL
Viagem em bolhas de água até o castelo da bruxa boa:
equipe de 700 artistas para criar 1.500 efeitos digitais
Na história mais conhecida do personagem, aquela estrelada por Judy Garland, um velho Oz se apresenta como um péssimo mago e confessa ser uma farsa. Vem daí a associação que sempre se fez da sua figura com a dos poderosos que se mantêm no comando sem uma real representatividade. Logo no início da produção atual, o vemos alternar conhecidos clichês entre galã e trapaceiro dos picadeiros: escolhe como estrela de seus números de magia a mais bonita garota da trupe (a quem seduz, claro), engana o assistente na partilha dos centavos recebidos pelos truques de quinta categoria e vive fugindo dos pagantes ludibriados. Ao brigar com o halterofilista da companhia, foge em um balão e é levado por outro tornado, fenômeno climático muito comum nessa região dos EUA. Acaba aterrissando em Oz, cujos habitantes acreditam na profecia de que um mágico irá salvar o reino de suas divisões internas, provocadas por três bruxas.
Esse lado de conto de fadas é, para muitos, mero pretexto usado por Baum para tratar das forças políticas nos EUA no final do século XIX e início do século XX. Nesse período, debatia-se a questão do lastro em ouro, exigência para a emissão de papel-moeda cuja pequena circulação estava endividando tanto os agricultores (representados pelo espantalho sem cérebro) como os industriais (simbolizados pelo homem de lata, sem coração). Assim, a Estrada de Tijolos Amarelos, que levaria à Cidade de Esmeralda, seria uma alusão a esse padrão monetário – o mágico representaria um banqueiro, e o leão sem coragem, os políticos em geral, incapazes de atender às necessidades da população. A apropriação atual da história não foge completamente dessa visão social, mas não se submete ao alcance de sua metáfora. Ao se deparar com o tesouro guardado em Oz, o primeiro impulso do ilusionista é usufruir da riqueza, aceitando se passar como o “salvador da pátria”. Mas, ao enganar a população, não é pintado feito um tirano, como era de se esperar: é visto como um atrapalhado arrivista.
Numa jogada de mestre, o diretor Sam Raimi pinta a política (pois é disso que se trata, afinal) como um espetáculo, mas associa seus meios de ludibriar as pessoas aos próprios recursos do cinema: é com a técnica da projeção de sua imagem em movimento que Oz se impõe diante das massas e vence as bruxas do mal. Como cineasta, Raimi se mostra na posse de todo esse arsenal. Seu “Oz” é um requintado espetáculo visual do início ao fim, com efeitos visuais (1.500 ao todo) usados sem exibicionismo. Para conseguir melhores atuações, preferiu construir 30 cenários em uma ex-fábrica de caminhões da General Motors, perto de Detroit, área equivalente a 23 mil metros quadrados. Tudo isso a favor da magia.