Até meados de 1999, a vastidão dos 360 mil metros quadrados do estaleiro Verolme, cravado no balneário fluminense de Angra dos Reis, estava entregue a apenas seis empregados. Fulminada pela crise do setor naval que começou na década de 80 e por quase 20 anos fez minguar os recursos e as encomendas de navios, a empresa fechou as portas. “Aquilo era um espaço-fantasma, com bons equipamentos ociosos, enquanto o Brasil comprava grandes embarcações no Exterior”, recorda Luiz Chaves, presidente do Fórum Intersindical dos Trabalhadores da Indústria Naval e Off-Shore. Há cinco anos, as condições para investimento nessa indústria começaram a melhorar e o consórcio Fels Setal, controlado por um grupo de Cingapura, reabriu o Verolme, rebatizado como Brasfels. Hoje, o estaleiro emprega cerca de seis mil trabalhadores. Outras empresas estrangeiras se animaram com a retomada e escolheram o parque industrial do Rio de Janeiro para construir navios. Como a Jurong, também de Cingapura, que assumiu o estaleiro Mauá, o grupo norueguês Aker, que se associou ao estaleiro Pomar, ou o italiano Rodriques Navalli, que veio para construir pequenas embarcações de passageiros. Os números não podiam ser mais espetaculares. Entre plataformas e embarcações já licitadas ou a licitar, somente a Petrobras vai gerar negócios da ordem de US$ 6 bilhões este ano. O resultado mais expressivo é a multiplicação de postos de trabalho: se em 1999 o número de empregos diretos não passava de 500, hoje chega a 18 mil.

O Estado mais beneficiado é o Rio de Janeiro, que concentra 90% da indústria naval do País. “Esse segmento representa para o nosso Estado o mesmo que a indústria automobilística para São Paulo”, compara Wagner Victer, secretário estadual de Energia, Indústria Naval e Petróleo. A política de revitalização começou na gestão do governador Anthony Garotinho, quando os construtores passaram a se beneficiar de incentivos fiscais como isenção de ICMS. “Dezesseis estaleiros foram reabertos ou revitalizados. Essa retomada acontece de maneira consequente, progressiva e sustentável”, afirma Victer. A base do processo foi a mudança de postura da Petrobras, que passou a transferir a construtores nacionais as encomendas antes feitas a estaleiros estrangeiros. No início, a demanda era apenas por reparos, mas logo a estatal decidiu fazer as plataformas para prospecção de petróleo no Brasil.

Presidente da Pem Setal, que detém 40% do consórcio Fels Setal, controlador do estaleiro Brasfels, o paulista Augusto Mendonça destaca que só recentemente o excelente desempenho do setor começou a chamar a atenção. “É um segmento com muitas oportunidades e muito espaço para crescer”, afirma. O Brasfels ganhou a licitação para construir as plataformas P-51 e P-52, no valor de US$ 1,5 bilhão. Ainda este ano, a Petrobras deve licitar a construção de outras plataformas no valor de US$ 1,5 bilhão e de navios de transporte no valor de US$ 3 bilhões. As perspectivas de médio prazo são excelentes. O País gasta atualmente cerca de US$ 5 bilhões com frete, e a intenção do governo federal é dobrar o movimento. “Além da Petrobras, existem outras 40 companhias buscando petróleo no Brasil. Elas também têm sua demanda”, afirma Mendonça. O financiamento para os investidores é feito pelo Fundo de Marinha Mercante e pelo BNDES. No governo Fernando Henrique Cardoso, as plataformas eram feitas por estrangeiros, beneficiados por impostos mais leves do que os cobrados dos grupos nacionais. Agora, a carga tributária é igual (10%) e as empresas brasileiras mostraram ter qualidade e prazo para ganhar a concorrência. “O governo Lula já provou que o setor naval é uma prioridade”, diz o presidente da Pem Setal.

Os executivos da Jurong também resolveram investir, atraídos pelo programa de investimentos off-shore da Petrobras. Quando o grupo assumiu, o estaleiro Mauá tinha menos de 30 empregados e hoje tem cinco mil postos de trabalho. Suas principais encomendas são os serviços de reparo naval e a integração das plataformas P-43 e P-50. “Existe petróleo a produzir e carga sendo transportada com frete em dólar. Por isso, nossas expectativas não são otimistas, mas realistas”, afirma Roberto Simas, diretor comercial do Mauá Jurong. Ele acredita que as condições de financiamento ainda podem ser simplificadas. O presidente do Fórum Intersindical tem boas expectativas com relação ao futuro da construção naval. “Somente para estes 52 navios que a Transpetro deverá licitar no ano que vem serão criados 28 mil empregos diretos e indiretos”, exemplifica Luiz Chaves.
Bio Barreira      
Pioneirismo: a Embraer entrou na era dos jatos e já se prepara para fazer supersônicos      

Do mar ao ar – Assim como na indústria naval, no setor aeronáutico a questão da transferência de tecnologia é fundamental, inclusive para a geração de empregos. E nesse setor a Embraer exerce papel preponderante. O projeto mais ambicioso dessa empresa foi a co-produção do avião de ataque AMX (A-1), desenvolvido em conjunto pelo Brasil, através da Embraer, e pela Itália (Alenia e Aermacchi) a partir de 1981. Isso porque esse empreendimento permitiu à Embraer adquirir um aprendizado que proporcionou condições para que o Brasil entrasse na era dos jatos regionais. O passo inicial foi o ERJ-145, lançado em 1995 com capacidade para 50 passageiros, que se tornaria um sucesso mundial de vendas. Hoje, a empresa evoluiu e já produz o modelo EMB-190, com capacidade para 108 passageiros.

Para a Embraer, o grande desafio está colocado pelo Programa FX da Força Aérea Brasileira, que prevê a seleção e aquisição de caças supersônicos que substituam os velhos Mirage IIIEBR, adquiridos na década de 70 para a proteção do espaço aéreo de Brasília, e devem
ser desativados até o final de 2005. O programa, no valor de US$ 788 milhões, prevê a compra, num primeiro estágio, de 12 caças e tem
cinco concorrentes: a Embraer, que em consórcio com empresas francesas lideradas pela Dassault, oferece o Mirage 2000-5Br;
a Avibrás Aeroespacial, associada à empresa russa Rosoboronexport,
que tem o Sukkhoi Su-35; a anglo-sueca Saab/BAe, com o JAS-39 Gripen; a americana Lockheed Martin, com o F-16; e a russa RAC-MiG, com o MiG-29.

Assim como o projeto AMX permitiu à Embraer ingressar na era do
jato, o Programa FX poderá significar a entrada do Brasil na era da aviação supersônica. As empresas francesas responsáveis pelo Mirage 2000-5Br – Dassault, Thales, Snecma, – estão associadas à Embraer, o que facilitaria a absorção, pelo Brasil, da tecnologia empregada no caça francês. Afinal, nenhuma outra empresa nacional que estabeleceu parcerias com fornecedores estrangeiros tem o know-how e a expertise da Embraer na construção de aeronaves. Além disso, graças à inexistência de restrições à transferência de tecnologia por parte da França, o País teria autonomia para o desenvolvimento do Mirage 2000-5Br, permitindo à Embraer, sob solicitação da FAB, modificar o sistema da aeronave, adaptando-a às condições nacionais.