De toda a água do planeta apenas 2,5% é doce e o Brasil é o país que tem a maior reserva do mundo, com 6.220 bilhões de metros cúbicos. Mesmo assim, algumas de suas principais cidades, como Belém, Manaus, Recife, Curitiba, Porto Alegre e São Paulo, enfrentam
uma de suas piores crises de abastecimento. A situação está tão crítica que São Paulo, a maior metrópole brasileira, está à beira de um colapso. “Assim como o apagão, corremos o risco de enfrentar um outro racionamento, o sujão”, compara Aldo Rebouças, pesquisador do Instituto de Estudos Avançados da USP e um dos maiores especialistas nacionais em água.

Diante desse quadro, a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) lançou uma campanha que, além de apelar para o bom senso, vai mexer pela primeira vez no bolso do consumidor. Quem conseguir diminuir o seu gasto mensal em 20% ganhará um desconto semelhante na conta de água. Isso vale também para apartamentos, que costumam ter medidores únicos. Nesse caso, é importante o esforço conjunto dos moradores. Se o edifício atingir a meta, o desconto será aplicado nas despesas de condomínio. A proposta, porém, não deve agradar a todos, pois o bônus não é proporcional à quantidade de água economizada. Os consumidores que conseguirem uma redução de 21% ou 50%, por exemplo, vão receber os mesmos 20% de desconto. Mas ainda que a população colabore e que chova o suficiente para elevar o nível dos reservatórios, o risco de um racionamento de água não está descartado.

O sistema Cantareira, o maior reservatório da cidade, apresenta o nível mais baixo de sua história. Responsável pelo abastecimento de nove milhões de pessoas, ele está com apenas 17,6% de sua capacidade total. Mas não dá para culpar apenas São Pedro. “O problema de São Paulo, assim como de outras metrópoles, é a falta de gerenciamento, a degradação da qualidade dos rios e esgotos não tratados”, afirma Rebouças. O maior vilão, porém, ainda é o desperdício. A região metropolitana consome 65 mil litros de água por segundo. Com essa campanha, prevista para terminar em setembro, o governo espera chegar a 43 mil litros, o que não é pouco. “O Brasil dorme em berço esplêndido. Há muito o que cortar dessa abundância”, diz Rebouças. Pela Organização Mundial de Saúde (OMS), a quantidade suficiente para atender às necessidades normais de uma pessoa é de 120 litros por dia. A média paulistana é de 180 litros. E o Brasil não fica atrás, com 150 litros por habitante.

Daqui para a frente a conscientização popular do bom uso da água torna-se ainda mais fundamental. Mas há medidas que podem evitar que outras cidades brasileiras passem pelo mesmo problema. Uma delas é a captação da água das chuvas por meio de cisternas, espécie de caixa-d’água gigante. “Nas regiões semi-áridas essa prática tem se mostrado eficiente”, diz Jerson Kelman, diretor-presidente da Agência Nacional das Águas (ANA). A medida é aplicável também nas grandes cidades a partir da instalação dessas cisternas sobre as construções. “A água da chuva pode ser usada para lavar carros, roupas e de quebra ainda colabora no combate às enchentes”, diz Kelman.

A preocupação com a água não é exclusividade brasileira. Há um consenso mundial de que não se pode continuar desperdiçando esse recurso finito. Assim, o dia 22 de março, data em que se comemora o Dia Internacional da Água, tornou-se um momento de reflexão. Este ano o tema é Água e Desastre. Para os especialistas, o impacto das enchentes e de outras catástrofes naturais pode ser amenizado se o homem estabelecer uma relação mais cuidadosa com o meio ambiente.