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MINÚCIA
Valdirene Ambiel, a arqueóloga responsável pelo
estudo, acompanha a tomografia de dona Leopoldina

Entre os meses de fevereiro e setembro de 2012, um estranho movimento tomou o entorno do Monumento à Independência, que fica no bairro do Ipiranga, zona sul da capital paulista. Quem resolvia questionar os seguranças que isolavam o acesso à cripta – que fica embaixo do monumento e guarda os restos mortais de dom Pedro I, imperador do Brasil, dona Leopoldina, sua primeira mulher, e dona Amélia, sua segunda esposa – recebia uma resposta protocolar: estamos em reforma. Não era bem isso. Naqueles meses, os corpos dos três membros da família imperial foram exumados e cuidadosamente estudados.

Em três ocasiões, sempre durante a madrugada, eles foram levados, um por vez e dentro de suas respectivas urnas funerárias, do Ipiranga ao Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC/FM-USP), a 23 quilômetros de distância, para passar por exames. Os três foram submetidos a uma tomografia computadorizada e dom Pedro também a uma ressonância magnética. “Sempre torci para que um trabalho como esse fosse feito com a família imperial”, diz Valdirene do Carmo Ambiel, 41 anos, historiadora e arqueóloga responsável pelo projeto de exumação. “Nunca imaginei que eu faria esse trabalho”, diz ela.

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Fascinada desde a infância com o Egito, Valdirene acabou escolhendo a história e a arqueologia como profissão. “Como não dava para fazer egiptologia no Brasil e eu não tinha condições de bancar um curso no Exterior, acabei tentando fazer algo parecido por aqui”, conta. Pouco mais de um ano separou o primeiro contato dela com os representantes da família imperial dom Luiz de Orleans e Bragança e Wittelsbach e dom Bertrand de Orleans e Bragança e Wittelsbach, e a autorização para começar o projeto. De início ressabiados, eles logo se empolgaram com o trabalho e se mostraram tão curiosos como Valdirene quanto ao estado dos restos imperiais. Mas só a autorização da família não bastava. Valdirene teve de conseguir autorizações de pelo menos 11 instituições dos três âmbitos de governo envolvidos para finalmente começar a trabalhar.

A abertura tanto da tumba de dona Leopoldina quanto de dom Pedro I e de dona Amélia foi tranquila. Nessas ocasiões estiveram também presentes um representante da família imperial brasileira e um sacerdote, que fazia uma oração em latim. Uma vez expostos, os corpos eram cuidadosamente estudados por períodos que variavam entre um mês e meio e dois meses. Os dias na cripta envolviam até seis profissionais, começavam às 9 horas, não tinham hora para acabar e eram tomados pelo trabalho de limpeza, manutenção e registro das informações em foto e vídeo. Milhares de imagens e 870 horas de filmagens foram acumuladas. A grande surpresa ficou por conta do estado de preservação de dona Amélia, que estava mumificada.

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A sorte de encontrar a segunda imperatriz preservada lembra o objetivo original do projeto: garantir a preservação do patrimônio. “A esperança é de que agora o cuidado na cripta aumente”, diz Valdirene. Quem sabe novas exumações, motivadas pela pesquisa, também aconteçam. “Mas não pretendo me envolver com outras exumações tão cedo”, diz a arqueóloga. “Agora quero me dedicar ao estudo dos dados que coletei para produzir meu doutorado.”

Foto: Valter Diogo Muniz. infografia: Fernando Brum e Rica Ramos


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