A cada nova categoria anunciada na 76ª entrega do Oscar, ocorrida em Los Angeles, no domingo 29, sempre que aparecia entre os concorrentes o nome do épico O senhor dos anéis – o retorno do rei, a aposta era a de que os vitoriosos seriam da equipe neozelandeza do diretor Peter Jackson. Dos 11 prêmios a que concorria, a saga mitológica baseada no calhamaço de J.R.R. Tolkien abocanhou todos. Foi vencedor de melhor filme, diretor, roteiro adaptado, trilha sonora, canção, montagem, direção de arte, figurino, efeitos visuais, maquiagem e, ufa!, melhor som. O feito só o equipara aos também épicos Ben Hur (1959), de William Wyler, e Titanic (1997), de James Cameron.

Descontando o desfile de beldades, como Catherine Zeta-Jones e a sul-africana Charlize Theron, melhor atriz pelo ainda inédito no Brasil Monster, a falta de surpresas tornou o espetáculo de 3h30 um pouco monótono. Especialmente para os brasileiros, porque O senhor do anéis saiu vitorioso em três das quatro categorias em que concorria Cidade de Deus, de Fernando Meirelles. O filme brasileiro ainda perdeu o prêmio de melhor fotografia para Mestre dos mares – o lado mais distante do mundo. “Venceu o que era lógico e razoável”, declarou Meirelles, após a entrega dos prêmios. “A Academia criou esse prêmio para valorizar e promover o cinema americano. Cidade de Deus era reconhecidamente a zebra mais listrada deste ano. Acho até que fomos longe.” Pode-se dizer quase o mesmo de Gone nutty, curta-metragem de animação do carioca Carlos Saldanha, que perdeu para Harvie Krumpet, do australiano Adam Elliot.

Hollywood deixou claro seu recado ao reconhecer com tantos louros a ambiciosa empreitada do neozelandês Peter Jackson, que mais parecia vestido para matar um orc do que para a cerimônia do Oscar. No caso de Jackson é este tipo de produto que interessa à indústria do cinema, não sem motivo o segundo filme mais visto da história, com uma renda de quase US$ 1 bilhão. Sonora ironia, ao se lembrar que este foi justamente o ano em que a Academia se mostrou mais aberta a produções menores, como

Encontros e desencontros

, de Sofia Coppola, que levou a estatueta de melhor roteiro original. E também a talentos de fora, a exemplo das presenças da maori Keisha Castle-Hughes, da iraniana Shohreh Aghdashloo, do natural de Benin, Djimon Hounsou, e do japonês Ken Watanabe. Sem falar na inclusão de

Cidade de Deus

entre as categorias de peso. Não serve de consolo, mas a julgar pela lógica das indicações soa mais estranho a magra atenção a títulos na linha de

Sobre meninos e lobos

– que levou os Oscar de melhor ator para Sean Penn e de ator coadjuvante para Tim Robbins – e de

Mestre dos mares

, só reconhecido pela fotografia e pela edição de som.