Agora vai. Ou melhor, vem. A Câmara de Direito Público do Tribunal Federal de Justiça da Suíça, em Lausanne, vai mandar para o Brasil cópias da documentação bancária do ex-prefeito Paulo Maluf (PP). Há dois anos, o Ministério Público paulista tenta obter cópias dos extratos de Maluf, prefeito de São Paulo entre 1993 e 1996. A chegada da documentação é apenas uma questão de dias. “Obedecendo aos trâmites legais, o dossiê sobre as contas da família Maluf será entregue à Embaixada do Brasil, em Berna, depois da publicação da sentença da corte suíça, e chegará ao País nos próximos 30 dias”, acredita o promotor Silvio Antônio Marques. A notícia sobre os extratos de Maluf repercutiu no Exterior. A decisão da Justiça suíça foi tema de reportagem do jornalista Jean-Noël Cuénod, do journal Tribune de Genève com o sugestivo título: “Justiça de Genebra vai lançar bomba política no Brasil.”

Nesse caso, especificamente, a história toda começou em setembro de 2001, quando o Citibank, de Genebra, suspeitou de uma transferência de US$ 200 milhões para sua filial na Ilha de Jersey – paraíso fiscal localizado no canal da Mancha. O dinheiro depositado em duas contas em nome de Maluf e seus familiares está bloqueado. Na época, o governo suíço informou às autoridades brasileiras que o ex-prefeito manteve a conta no Citibank de Genebra, entre 1985 e 1997, quando então o transferiu para a agência de Jersey.

Investigado também no Brasil pelos crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e evasão de divisas, Maluf bate na mesma tecla desde o surgimento do escândalo: “Não tenho e nunca tive conta no Exterior.
A divulgação dessa notícia é manobra de caráter político eleitoral”,
foi o que ele, mais uma vez, mandou dizer a ISTOÉ, na quinta-feira 26, através de seu assessor de imprensa, Adilson Laranjeira. O promotor rebate: “A Suíça só libera documentos bancários se houver prova da origem criminosa do dinheiro. E eu as tenho e as enviei.” E acrescenta: “Estamos ganhando tanto no caso do Maluf quanto no do (Celso) Pitta (ex-prefeito de São Paulo). A maior parte do dinheiro é de origem do superfaturamento de obras públicas, entre elas a avenida Águas Espraiadas e o Túnel Ayrton Senna.”

Mesma linha – Celso Pitta – secretário municipal de Finanças na administração de Paulo Maluf – sucedeu o chefe na administração
paulista entre 1997 e 2000. Para um secretário que virou prefeito, em 1999 Pitta já estava bem de vida. Tinha mais de US$ 1 milhão no Multi Commercial Bank, de Zurique. Desse total, US$ 930 mil foram transferidos para Guernesey, outro paraíso fiscal no canal da Mancha, vizinho a Jersey. “Os extratos de Pitta já estão no Brasil, sendo traduzidos; chegaram semana passada”, garantiu Silvio Marques. Pitta usou a mesma tática do padrinho e mandou dizer, pelo assessor e ex-secretário de Comunicação de seu governo (Antenor Braido): “Não tenho conta na Suíça, nem em Guernesey, nem em qualquer outro lugar. O caso, em questão tem mais conotação política do que jurídica”.

Com os extratos bancários, o promotor Silvio Marques vai poder entrar com uma ação de improbidade administrativa contra os ex-prefeitos. “Vou pedir a devolução do dinheiro aos cofres do município e também a aplicação de uma multa de US$ 600 milhões”, que, convertidos, somente no caso de Maluf chegam a R$ 2,3 bilhões”, contabilizou. O promotor está confiante: “Durante esses dois anos eu travei uma luta árdua para ter acesso a essa documentação. Produzi provas, ouvi mais de 50 pessoas, mais de 50 sigilos foram quebrados. Maluf recorreu em Genebra três vezes e perdeu todas. Eu tenho uma montanha de provas de que houve superfaturamento na construção da avenida Águas Espraiadas.” Uma das principais testemunhas de Marques é Nicéia Camargo, ex-mulher de Pitta. “Denunciei todo o esquema de corrupção e de envio de dinheiro para contas no Exterior. Considero a vinda desses extratos uma vitória do Ministério Público, que acreditou na minha pessoa”, diz Nicéia, que já sofreu diversas ameaças de morte e dezenas de processos por causa das acusações. “Fui processada civil e criminalmente em cerca de 50 processos. Até agora fui absolvida em todos eles.”

A Suíça não é o único país que investiga as supostas operações financeiras realizadas por Paulo Maluf. Há suspeitas de que ele tenha realizado operações irregulares em instituições financeiras na França

e nos Estados Unidos. A promotoria de Nova York, por exemplo,

investiga o envio de dinheiro do Brasil para a Suíça. Depois de tantas negativas, ele admite ter apenas uma conta fora do País: na França. Em 24 de julho de 2003, ele foi detido em Paris, em uma agência do banco Crédit Agricole, para esclarecer a origem de US$ 1,46 milhão – depositado pela Fundação Blackbird, empresa de seu filho Flávio Maluf, em Liechtenstein, que mantém uma conta no Banco Barings, em Genebra. Maluf teve ainda que explicar duas transferências – de US$ 73,8 mil e US$ 116 mil – feitas pela mulher, Sylvia, para o Crédit Agricole. Na época, declarou: “Abri a conta por motivos fúteis” para arrematar em seguida: “O dinheiro tem uma origem maravilhosa. É produto da venda de um terreno adquirido por meu pai na década de 40.” Essa conta também está bloqueada, dessa vez pelos franceses.