Nasceu preto. E pobre. E de nome Edson Arantes do Nascimento. Bem diferente do que hoje o Edson – com uma fortuna estimada em US$ 40 milhões – costuma dizer em terceira pessoa sobre o Pelé: "O Pelé não tem cor, não tem raça, não tem religião, está acima dessas coisas mundanas. Se Beethoven houve só um, por que Pelé haveria dois?" É verdade. Pelé só existe um. Dentro e fora dos campos. Nas duas situações é uma marca mundial tão famosa quanto a Coca-Cola. A diferença é que longe dos gramados, Pelé, o maior jogador de futebol de todos os tempos, é um mito esculpido pelo próprio Edson Arantes do Nascimento. E nessa criação não há espaço para o atleta. É o mundo dos negócios, da política, do marketing, etc. que está em jogo. O Pelé jogador, por sua vez, e foi eleito este ano numa cerimônia em Viena, na Áustria, o atleta do século no futebol. A sua carreira, vejamos: tricampeão mundial pela Seleção Brasileira (1958, 1962 e 1970), bicampeão mundial interclubes pelo Santos (1962 e 1963) e dez campeonatos paulistas (1958 a 1974), entre outros títulos. Em 21 anos como atleta (parou de jogar em 1977) fez 1.275 gols. O milésimo, marcado há 30 anos (19/11/1969), foi histórico. Escreveria Nelson Rodrigues na sua crônica após o gol de pênalti na vitória do Santos (2×1) sobre o Vasco, no Maracanã: "Bem sabemos que futebol é um esforço coletivo. São os times que ganham, perdem ou empatam. Mas no caso de Pelé foi um só. Só ele marcou os mil gols. Nunca se viu nada parecido no mundo. É uma glória maravilhosamente individual, maravilhosamente solitária." Além dessa marca, Pelé possui outra igualmente única para um jogador: a fama de chorão. Ele se emociona facilmente. "Sou um manteiga-derretida. Todos sabem disso", afirmou. Em Viena, ao receber a condecoração, chorou. No México, em 1970, chorou também. No milésimo gol, idem. E isso, desde o início no Santos, em 1957. Numa entrevista concedida em 1966 ele disse: "Quando vejo um crioulinho só de calção, com suspensório de pano, pé descalço, carinha suja, olho vivo… chego perto… falo com ele ou o aperto em meus braços, choro feito criança… Por quê? Não posso me conter… choro mesmo!" O mesmo choro que comove o Edson quando vê o eterno Pelé. "O prazer de jogar futebol acabará antes de minha forma física. Então, deixarei o futebol, mas nunca de ser Pelé", disse na mesma entrevista de 1966. "E ser Pelé, para mim, é o que sentimos juntos, os torcedores e eu, apenas quando jogo bem."