A palavra aikido é formada por três ideogramas japoneses. Ai significa harmonia. Ki é energia. Do representa filosofia, caminho. Em São Paulo, alguns instrutores resolveram mostrar esse caminho a crianças e adolescentes de bairros carentes da cidade. O resultado? Uma garotada disciplinada e cheia de estímulos. No Lar da Bênção Divina, no Jardim Los Angeles, 15 crianças de favelas vizinhas treinam todos os sábados de manhã e já demonstram pequenas mudanças de comportamento. “Os meninos se sentiam no direito de bater nas meninas porque era esse o modelo trazido de casa. No tatame, perceberam que homens e mulheres são iguais. E trocaram a rebeldia por educação e respeito aos mais velhos”, conta Silvia Maria Battistella Bueno, presidente da entidade. Mãe de um praticante de aikido, ela garante que os treinos ensinaram noções de limites ao filho. Bastou para que ela se convencesse a abrir as portas ao instrutor Eduardo Shimahara, 31 anos, da academia Maruyama. “Como nossos alunos têm menos de dez anos, a disciplina é associada à espontaneidade das crianças. Dividimos o grupo em clãs e realizamos dinâmicas competitivas”, diz o professor.

Em uma das brincadeiras, as crianças penduram uma toalhinha nas costas. O objetivo é roubar a toalha dos adversários sem deixar que roubem a sua. De forma lúdica, aprendem a nunca dar as costas ao inimigo. “O aikido ensina a se defender sem machucar o agressor”, recita Wanderson Santos, nove anos, morador da favela Coréia. Em outro canto da cidade, a jovem Lindinalva Gomes da Silva, 16 anos, veste o seu dogui (uniforme) toda sexta-feira de manhã. Nos treinos ministrados no Jardim Jaqueline por José Roberto Bueno, 42, da Aikido Harmonia, Lindinalva é a aluna mais velha. “Bueno deu uma palestra na Casa da Criança e do Adolescente Betinho e fiquei encantada. Vivia um período de stress e o aikido é muito relaxante”, diz ela.

Além do trabalho na favela, Bueno instrui uma turma de alunos excepcionais e planeja criar um grupo com deficientes visuais. No segundo semestre de 2002, ele levou a garotada do Jardim Jaqueline para o Encontro da Confederação Sul-americana da Arte Aikido. “Enquanto os outros se apresentavam com pompa e espada, nossas crianças usavam shorts e camiseta”, lembra. A comoção foi tanta que ali mesmo foi arrecadado o suficiente para a aquisição dos uniformes. Ponto a favor da auto-estima dos praticantes. “Quando iniciei o projeto, havia o receio de que eu estaria contribuindo para a violência na favela. Mas logo perceberam que o aikido é o antídoto da luta, uma maneira de harmonizar relações difíceis”, diz Bueno. Não é à toa que aikido tem harmonia até no nome.