Emagrecer é uma tarefa ingrata. Afinal, exige sacrifício em um dos maiores prazeres do ser humano: o de comer. Para entender melhor o que se passa na mente de um indivíduo disposto a enfrentar uma dieta, especialistas coordenados pelo endocrinologista Walmir Coutinho, do Rio de Janeiro, desenvolveram uma pesquisa com mil pessoas que procuraram auxílio médico para perder os quilos a mais. Os pacientes envolvidos no estudo foram atendidos em clínicas particulares e no Instituto Estadual de Diabete e Endocrinologia do Rio. O resultado parcial desse levantamento, que começou a ser feito três anos atrás, foi apresentado durante o 1º Curso Avançado de Tratamento da Obesidade, realizado recentemente em São Paulo.

Uma das conclusões que mais chamam a atenção é a meta de emagrecimento dos pacientes, a maioria mulheres. Entre as entrevistadas, as consideradas obesas – condição de quem tem índice de massa corpórea superior a 30 (para saber o seu, divida o peso pela altura ao quadrado) – manifestaram expectativa de perder 34% do peso. Patamares elevados representam para essas mulheres o caminho para atingir o peso dos seus sonhos. Mas elas se enganam. Um objetivo alto como esse praticamente só pode ser obtido depois de uma cirurgia de redução do estômago. “É difícil emagrecer tanto e manter o peso a longo prazo”, afirma Coutinho. Por isso, os especialistas recomendam que a meta de perda seja de 10%. O porcentual mais modesto aumenta as chances de o objetivo ser conquistado e sustentado. Mas sabe-se que esse índice não é suficiente para todos. A saída é esperar alguns meses para confirmar a estabilidade e fazer nova tentativa para reduzir as medidas em mais 10%.

A verdade é que não são poucos os
que embarcam na neurose do emagrecimento rápido. Na busca do corpo perfeito, mesmo os que não são obesos estabelecem metas altas. A webdesigner Renata Piratininga, 22 anos, 1,56 m, de São Paulo, se encaixa nesse quadro. “Já fui bastante neurótica. Achava que tinha de perder dez quilos para chegar ao peso ideal. Estava com 64”, conta. A meta de redução era de quase 15%. Com a ajuda de remédios, Renata atingiu 50 quilos há dois anos. Tempos depois, engordou e recuperou quatro. Agora, batalha para baixar mais um.“Para chegar a 53, controlo a alimentação”, diz. Pela manhã, ela come apenas um pãozinho com um copo de leite. A história de Renata ilustra mais um dado apontado pela pesquisa: mais de 20% dos participantes não tinham excesso de peso.

Os primeiros resultados do trabalho apontam ainda que 55% dos pacientes procuraram os médicos por motivos estéticos, 42% por questões de saúde e 3% pelas duas razões. Além disso, a maioria já havia passado por atendimento. Numa amostra de 439 pessoas, 104 tinham feito de dois a quatro regimes. “Isso revela que muitas vezes o tratamento é malfeito”, diz Coutinho.

A pesquisa mostra também que as dietas podem se transformar em aliados da obesidade. Da amostra de 439 pacientes, 186 tentaram cinco tipos de regimes. E 106 pessoas arriscaram mais de dez. “A dieta do tipo restritiva entra como um elemento a mais na história da doença. Ela envolve mecanismos químicos e psicológicos que podem causar a compulsão alimentar”, explica o médico. É fácil entender por quê. Quando o regime restringe grupos alimentares, o indivíduo não ingere os nutrientes necessários. Isso pode levar à queda na produção de serotonina (substância associada às emoções), principalmente se os carboidratos forem cortados.

Para compensar os baixos níveis de serotonina, o organismo “exige” mais refeições. Esse problema químico é capaz de provocar a compulsão, caracterizada pelo consumo exagerado e descontrolado de alimentos. E, se a situação se tornar severa, o obeso pode sofrer de transtorno de compulsão alimentar. Para configurar esse quadro, o problema deve se manifestar duas vezes por semana no período de três meses.

Um dos mecanismos psicológicos acionados pela dieta sem equilíbrio está associado à proibição de itens. O indivíduo sente desejo de comer o que não é permitido. Principalmente se for criança. A estudante Maria Lúcia Ciampolini, 46 anos, de São Paulo, conhece essa realidade. Quando adolescente, sua mãe a proibia de beber coca-cola. Por causa disso, ela comprava o refrigerante, guardava no criado-mudo a sete chaves e se trancava no quarto para tomá-lo. A proibição estimulou Maria Lúcia, que sempre esteve acima do peso, a consumir cada vez mais a bebida. Nessa época, ela ingeria em média duas garrafas com 300 ml de refrigerante. Hoje, ela toma quatro litros de coca-cola light por dia. “É como se fosse um vício”, conta. Atualmente, ela está se tratando para combater a obesidade. Maria tem 1,63 m e pesa 110 quilos. “Já consigo comer apenas nos horários certos. O próximo passo será substituir, aos poucos, a coca-cola por água e suco”, garante.

Outro fator que pode levar à compulsão é o próprio stress do regime.
É duro pensar que não se pode comer o que se gostaria. E isso vale inclusive para quem não é gordo. A professora paulistana Márcia Guterman, 32 anos, 55 quilos e 1,55 m, chegou a sofrer com isso.
“Sou baixa e qualquer quilinho aparece. Quando planejei emagrecer, cortei o carboidrato”, lembra. Ela pesava 60 quilos e não via resultados. Ficou abalada. Felizmente, Márcia encontrou uma solução saudável.
Ela começou a fazer musculação. Com os treinos, reduziu o peso e substituiu a gordura por massa muscular. Está satisfeita com o
sucesso dos exercícios. E não precisa abrir mão do prazer à mesa
para manter a forma.