A história se repete. À medida que as eleições se aproximam, os institutos de pesquisas de intenção de votos vão revelando um poder político muito maior do que aquele que deveriam ter. As sondagens sistemáticas sobre as preferências dos eleitores são aguardadas com grande expectativa e podem mexer com o dólar, a Bolsa, o risco-Brasil. Muita especulação para pouca mudança concreta no quadro eleitoral. As duas primeiras posições não se alteraram substantivamente desde março deste ano. Há três meses, o candidato da coligação PT-PL, Luiz Inácio Lula da Silva, lidera com 38% a 42% das intenções de voto, conforme o momento e a metodologia do instituto. “Depois do terrorismo econômico, da ocupação da fazenda do presidente Fernando Henrique Cardoso e das denúncias de corrupção em Santo André, o desempenho de Lula se mantém. Tudo para fragilizar o PT já foi usado e não houve quedas preocupantes”, comemora a líder petista, a senadora Heloísa Helena (AL). Já o candidato governista, José Serra (PSDB-SP), tem conseguido manter a segunda colocação, transitando na faixa entre 16% e 20% dos votos. “Ainda é cedo para as pesquisas refletirem o resultado eleitoral. Temos 100
dias de campanha, e o que vale é a pesquisa feita na urna. Tenho confiança de que nela estarei em primeiro, não em segundo lugar”, comenta, discreto, o senador.

Mas as sondagens mais recentes revelaram uma mexida significativa na disputa pelo terceiro lugar. Esse posto, que vinha sendo ocupado pelo candidato Anthony Garotinho (PSB-RJ) até o final de maio, foi tomado agora por Ciro Gomes (PPS-CE), que ultrapassou o ex-governador do Rio de Janeiro. Nas últimas rodadas, os institutos CNT/Sensus e Vox Populi confirmaram a ascensão do ex-ministro da Fazenda e a queda de Garotinho. No levantamento da Sensus, feito entre os dias 16 e 20 de junho, Ciro Gomes cresceu 2,5 pontos porcentuais. Já no Vox Populi, entre os dias 22 e 23 de junho, o salto foi de sete pontos. Ciro saiu de 9% para 16% das intenções de voto. Num eventual segundo turno com Lula, Ciro – que perde de 46% a 39% – tem uma performance melhor do que a de Serra, que fica com 38%, contra 47% do petista. O crescimento do candidato da Frente Trabalhista (PPS-PTB-PDT) já era projetado por todos os analistas políticos desde que foi homologada a coligação entre os três partidos.

Ninguém discorda de que o pulo
de Ciro nas pesquisas é o resultado
de uma combinação bem-sucedida entre a exposição televisiva e a utilização de sua namorada, a atriz global Patrícia Pilar, como âncora dos programas.
“Ela deu muita credibilidade ao programa. Mas o crescimento se deve à capacidade que Ciro demonstrou para discutir os problemas do País. Não é à toa que ele é o único que amedronta o governo e por isso os tucanos querem censurá-lo na tevê”, ataca o vice-líder do PPS, deputado Régis Cavalcanti (AL), referindo-se à iniciativa do PSDB de recorrer ao TSE para impedir que Ciro apareça nos programas de tevê do PTB e do PDT. Anteriormente, o fenômeno televisivo foi decisivo para o crescimento do próprio Garotinho e da ex-candidata Roseana Sarney (PFL-MA).

Adesões – Ciro tem mais um programa de 20 minutos do PTB, na
quinta-feira 27, e 30 inserções de 30 segundos até o final do mês. Depois, só no horário gratuito, que começa em 20 de agosto. A principal diferença entre Ciro e Garotinho é que o primeiro conta com uma aliança em todo o País e, por isso, terá mais tempo de televisão. Outro ponto a favor de Ciro é o apoio de pefelistas que controlam grandes colégios eleitorais e se recusam a apoiar Serra. É o caso de Antônio Carlos Magalhães (BA) e Jorge Bornhausen (SC) e também de colégios menores, como Amazonas e o próprio Ceará. “Este crescimento do Ciro estava previsto, mas a campanha está polarizada entre o Lula e o Serra. Fica difícil para um terceiro furar este bloqueio”, minimiza Geraldo Mello (RN), líder tucano no Senado. Na segunda-feira 24, os principais caciques do PMDB improvisaram uma reunião exclusivamente para discutir os novos números de Ciro.

Os chefões do partido estão preocupados com a retomada de fôlego do ex-governador e aconselharam Serra a começar a bater também no candidato do PPS. “No primeiro teste da tevê ele passou com louvor”, reconheceu o líder do PMDB no Senado, Renan Calheiros. “Ele com tempo na tevê é perigoso”, alertou um conterrâneo e antigo aliado de Ciro, o senador Sérgio Machado (PMDB). Serra, que vinha ignorando o preferido do governador tucano, Tasso Jereissati (PSDB-CE), concordou com a avaliação e disparou: “Ciro é padrão Collor. Se fosse para discutir com o Collor, eu discutiria com o original, e não com uma cópia.”

Espaço ao centro – A inquietação na seara governista também é compartilhada pelo cientista político Paulo Kramer, da Universidade de Brasília. “Há margem de expectativa para o surgimento de um novo nome na faixa da centro-direita. Todos estão procurando o que sobrou do guarda-roupa de Roseana Sarney, ou seja, muda pouco e não provoca medo. O Ciro deu um pulo bom e pode ocupar este espaço.” Kramer diz ainda que não há motivos para o candidato governista se sentir tranquilo no segundo turno. “Por ora, só o candidato do PT está com lugar assegurado no segundo turno. Há um espaço de centro-direita a ser conquistado. É mais ou menos como um armário quebrado. Se quebra o pé do lado direito, a louça toda se desloca para este lado”, compara Kramer. “Que não se surpreendam se o segundo turno for disputado por dois candidatos de oposição, Ciro e Lula”, aposta o líder do PDT na Câmara, Miro Teixeira. A sucessão presidencial foi desencadeada prematuramente, mas numa coisa todos concordam: o que vai valer mesmo são os 45 dias de telinha a partir de agosto. As pesquisas,
embora cada lado puxe a brasa para sua sardinha, ainda passarão por muitas mudanças.

Grampo suspeito

Desde o assassinato de Celso Daniel, há cinco meses, o QG petista desconfiava da existência da escuta telefônica nos celulares de políticos ligados à administração de Santo André. A intuição estava certa. Não só celulares, mas também telefones fixos, foram grampeados pela Polícia Federal numa lista de 11 páginas, com 22 números cada uma, totalizando 242 linhas interceptadas. Há desde o telefone de pessoas da favela Pantanal – onde morava a quadrilha que matou Daniel – até a linha do atual prefeito, João Avamileno. Os pedidos oficiais de escuta, isto é, os que tiveram a autorização do juiz Maurício Lemos Porto Alves, somam 41 números. “O restante tem grandes chances de ser grampo clandestino”, disse uma fonte do PT.

Não bastasse a possibilidade de uma escuta ilegal, as lideranças petistas questionam o motivo alegado pela PF para interceptar os telefones. Nos pedidos, o delegado Marcelo Vieira Godoy informou ao Judiciário que as linhas estariam sendo utilizadas pelo narcotráfico. “Ele ludibriou o juiz”, afirma o deputado federal Luiz Eduardo Greenhalgh (PT-SP), que acompanhou de perto as investigações da morte do prefeito. Como agravante, há o relatório de uma investigação paralela da PF, batizada de Operação Távola Redonda, onde o Ministério Público Estadual é citado como interessado em investigar contratos da prefeitura. “Que outros fins podem ter essa investigação se não forem políticos e eleitorais?”, questionou o secretário-geral do PT, Luís Dulci. No entanto, o procurador-geral de Justiça de São Paulo, Luiz Antônio Marrey, diz que o Ministério Público nunca foi consultado sobre as escutas realizadas. “Para o nosso tipo de trabalho, o grampo não nos interessa”, confirma o promotor José Reinaldo Carneiro, que denunciou o esquema de propina nas empresas de ônibus em Santo André.

Não parou por aí. Um terceiro documento apresentado pelo PT é um pedido de investigação contra Lula, digitado num papel timbrado da CPI do Narcotráfico, com data de 4 de dezembro de 2000. A Comissão encerrou seus trabalhos um dia depois. O delegado da PF Alberto Lasserre Kratzl Filho assinou o ofício para investigar Lula porque um tal de Fernando Tenório Cavalcanti teria informações sobre a compra de imóveis do presidenciável em São Bernardo, em nome de laranjas. As declarações de Tenório, que deixou apenas o número de telefone, sempre na caixa-postal, foram consideradas relevantes a ponto de a PF pedir diligências contra o candidato petista. O presidente da CPI do Narcotráfico, Magno Malta (PTB-ES), afirmou que o documento foi usado de má-fé. “É uma coisa armada mesmo”, garantiu.

Adriana Souza e Silva e Juliana Vilas