Uma ilha da fantasia, excelente para o surfe e o mergulho, com praias paradisíacas, hotéis dos mais luxuosos às cabanas à beira-mar e uma cultura fascinante e exótica para o Ocidente. Sombra fresca, água-de-coco e sol. Assim Bali, encravada na belíssima Indonésia, tornou-se o destino preferido dos hippies nos anos 60, o lugar da moda nos anos 90 e sinônimo de segurança e tranquilidade para os turistas ocidentais assustados com o terrorismo depois do 11 de setembro. No sábado 12, o lugar encantado foi para os ares em estilhaços de bomba que espalharam sangue e terror, no maior atentado da história da Indonésia, que matou pelo menos 181 pessoas e feriu mais de 300 – a maior parte turistas estrangeiros que embalavam a noite em duas discotecas, a Sari Blanc e a Paddys. Durante dias, parentes e amigos desesperados tentavam identificar os corpos através de objetos pessoais, como relógios e bijuterias. A maioria era de jovens australianos, britânicos e americanos. Entre as duas centenas de desaparecidos estão dois brasileiros, o sargento Marco Antônio Farias e o civil Alexandre Watake (leia quadro).

Uma equipe de investigadores indonésios, britânicos, americanos e australianos concluiu que o atentado teve participação estrangeira. A Casa Branca prontamente afirmou que Osama Bin Laden deixou suas impressões digitais. A operação sofisticada, o uso de carros-bombas e de explosivos C-4 (os mesmos utilizados no ataque contra o destróier americano USS Cole no Iêmen e nas embaixadas americanas no Quênia e na Tanzânia) seriam indicações de que alguém de fora deu uma mãozinha. “Os grupos locais são anti-Ocidente, mas nunca fizeram do Ocidente seu alvo. Eles usam facas, armas automáticas e bombas artesanais”, afirmou Kirsten Schulze, a especialista em terrorismo da London School of Economics. A nação de maior população muçulmana do planeta (90% dos indonésios, cerca de 200 milhões, são muçulmanos) está sendo cobrada pelos governos dos EUA, Reino Unido e Austrália a adotar uma posição mais dura em relação aos radicais islâmicos. “Esperamos que esse atentado reforce a determinação indonésia de lidar com esse tipo de ameaça”, disse o secretário de Estado americano, Colin Powell.

Os indonésios admitiram a participação estrangeira. O periódico Jakarta Post revelou que um malaio e um iemenita foram os arquitetos do atentado que ainda incluiu mais sete participantes. Mas o governo indonésio ainda insiste que o país é um dos mais moderados e que a integração entre os muçulmanos e as minorias hindu e cristã é muito boa. Bali era uma das poucas ilhas com maioria cristã e para alguns analistas apenas este fato já justificaria um ataque dos movimentos separatistas islâmicos. A unificação das diferentes etnias e religiões foi mantida sob o braço forte do ditador Suharto (1966-1998), mas desde o fim do regime o país vem sofrendo manifestações separatistas, como na província de Aceh, de maioria muçulmana. A maior parte dos líderes indonésios nunca quis colocar o dedo nesta ferida e, até então, essa atitude foi seguida pela presidente indonésia, Megawati Sukarnoputri, que tem como mote de campanha à reeleição de 2004 uma Indonésia unida. Mas desta vez Megawati, pressionada internacionalmente, teve que agir.

Na quinta-feira 17, Jacarta anunciou um pacote antiterrorismo com a pena de morte para crimes desse gênero e ainda mandou deter para ser investigado o clérigo Abu Bakaere Bashir, 64 anos, líder do grupo Jeemah Islamiyah, acusado pelo Ocidente de ter ligações com o Al-Qaeda. Bashir, professor de uma escola islâmica em Java, negou qualquer participação no atentado. O primeiro-ministro australiano, John Howard, exigiu de Washington que a Jeemah Islamiyah seja incluída na lista de organizações terroristas.Onda de pânico – Na obstinada guerra de Bush contra o Iraque, teme-se que seja acirrado ainda mais o sentimento anti-americano na Ásia e que as facções islâmicas ganhem mais projeção. Cinco dias depois da tragédia de Bali, nas Filipinas, duas bombas explodiram em Zamboanga, na Indonésia, matando cinco pessoas e ferindo 140. Zamboanga fica a 860 quilômetros ao sul da capital Manila, onde há três décadas os guerrilheiros islâmicos lutam por sua independência. Na mesma cidade, a polícia filipina ainda desmontou outras cinco bombas que poderiam ter causado muito mais estragos. As suspeitas desses atentados recaem sobre a facção radical islâmica de Abu Sayyaf, que supostamente mantém ligações com o Al-Qaeda, e é o segundo da lista dos procurados dos americanos logo após Bin Laden. Uma onda de pânico tomou conta de outros países do sudoeste asiático, como Malásia e Cingapura, que entraram em estado de alerta depois de acusarem o líder indonésio Bashir de tentar estabelecer um Estado pan-islâmico na região. Alguns analistas prevêem novos ataques e os governos americano, britânico e australiano pedem que suas populações deixem a Indonésia o mais rápido possível.

No momento em que até o paraíso foi incendiado, ficou evidente que o terrorismo depois de 11 de setembro pode acontecer a qualquer hora e em qualquer lugar, acentuando o sentimento de vulnerabilidade do Ocidente. E, enquanto Washington preocupa-se com Saddam Hussein e não consegue colocar as mãos em Osama Bin Laden e sua turma, paira no ar a especulação de qual será a próxima vítima.

A busca de brasileiros

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Itamaraty está acompanhando de perto a tentativa de resgate dos dois brasileiros desaparecidos, o massagista terapeuta Alexandre Watake, 33 anos, e o sargento do Exército Marco Antônio Farias, 24 anos. Mas para o embaixador brasileiro na Indonésia, Carlos Eduardo Sette, são poucas as chances de encontrá-los vivos. Ambos estavam na ilha temporariamente. Há mais de dois anos, Alexandre saiu do Brasil para trabalhar no Japão. Em setembro, ele foi contratado para dar aulas de shiatsu durante a alta temporada em um resort de Bali. Alexandre pretendia retornar ao Japão quando chegasse a baixa temporada, e depois voltar ao Brasil para conhecer seu filho. O sargento Farias passava a folga de fim de semana em Bali. O militar compunha o 19º Batalhão de Infantaria Motorizada, que cumpria a missão de paz no Timor Leste.

Antônia Márcia Vale


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