Com o País mergulhado na pior tormenta financeira dos últimos tempos, o PT não quer fazer marola. Antes mesmo do resultado das eleições, anuncia que se o candidato do partido, Luiz Inácio Lula da Silva, for eleito, está disposto a abrir mão de uma importante ferramenta de intervenção econômica: o nível das taxas de juro. O economista Guido Mantega, assessor econômico de Lula, está construindo uma proposta de autonomia operacional do Banco Central inspirada no modelo inglês, a ser anunciada logo após as eleições. Adotado em 1997 pelo primeiro ministro britânico Tony Blair, o sistema está no meio do caminho em direção aos BCs totalmente independentes, como o Fed americano e o Bundesbank
alemão pré-União Européia. Pela proposta petista, o governo teria o poder de definir as metas inflacionárias que considerasse conciliáveis com outros compromissos, como o aumento do emprego. Definidas as metas, o BC faria o que julgasse necessário para cumpri-las. Isso pode significar dolorosos aumentos nas taxas de juro em momentos de crise ou quedas mais lentas do que desejaria o Executivo. O projeto de Mantega também inclui mandatos fixos para a diretoria da instituição. A demissão de diretores ocorreria apenas em casos específicos, como incompetência ou falta grave. “O BC inglês, por exemplo, tem duas missões: manter a estabilidade e dar suporte à política econômica do governo de crescimento e emprego. A demissão por incompetência ocorreria no caso de descumprimento dessas missões. Mas tudo seria previsto em lei”, explica Mantega.

Transição – Tida como excelente calmante para o mercado financeiro, a fórmula do BC autônomo é usada em vários países para isolar as decisões econômicas das pressões políticas e transições eleitorais. Tem aliados de diversas colorações e pesos. É receitada, por exemplo, pelo FMI, que incluiu o tema no acordo de US$ 30 bilhões fechado com o Brasil. O País terá que aprovar ainda neste ano uma mudança para que o artigo 192 da Constituição, que trata do funcionamento de todo o sistema financeiro, possa ser regulamentado aos poucos, abrindo espaço para que a autonomia seja tratada rapidamente. O deputado Delfim Neto (PPB-SP) é outro defensor: “Isso daria ao PT e ao novo governo uma enorme estabilidade.” E o ministro da Fazenda, Pedro Malan, costuma mencionar o sistema de metas inglês como um exemplo de sucesso. Mas há aspectos do exemplo britânico que o PT nem pensa em copiar. Ao presentear o BC inglês com sua autonomia, o trabalhista Blair manteve no cargo o presidente anteriormente nomeado pelo Partido Conservador, ao contrário de Lula, que já anunciou a saída de Armínio Fraga.

Mantega não vê problemas em manter a atribuição do Conselho Monetário Nacional (CMN) de definir as metas inflacionárias, as reuniões do Copom e os relatórios periódicos de inflação, práticas que o atual governo já adota. Mas, para ele, as semelhanças com a gestão FHC são só aparências. “Hoje, isso ocorre por uma liberalidade do governo. Se o príncipe quiser, muda tudo”, diz.